Fotografia de José Figueira
nesse dia atravessei o inferno
com as mãos orvalhadas.
adivinhei lamúrias
receei perguntas
fuji das respostas.
oh, boca, voz
bailado sem corpo
na respiração amarela do medo
onde estás?
ambos conhecíamos a origem do sangue
(mel e jasmim, lembras-te?)
mas os deuses do silêncio
adormeceram em olimpos de sal como figuras
com favos nos lábios
e pétalas nos dedos.
por isso
deixei de acreditar nas bíblias dos homens
e o corão é os olhares escondidos em espelhos.
são homens a roer bagos de uva
são homens a calcar páginas brancas
são homens a roubar o círculo de fogo
são homens a procurar o pecado que engrandece
(reparaste como tudo se transforma
nas roldanas do silêncio?).
é preciso matar as palavras
afogá-las no seu veneno
fuzilá-las com a sua pólvora
apunhalá-las no seu cristal
apagá-las no seu rasto
riscá-las do poema
adormecê-las na sua insónia
trucidá-las no seu cinismo.
é preciso desinventar as palavras
para sabermos quando é a hora de morrer.
domingo, 23 de maio de 2010
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são homens a roer bagos de uva
ResponderEliminarsão homens a calcar páginas brancas
são homens a roubar o círculo de fogo
são homens a procurar o pecado que engrandece
(reparaste como tudo se transforma
nas roldanas do silêncio?).
*--*
Muito bom seus escritoos ! :)
bj
Olá, sara!
ResponderEliminaragradeço-te a visita e o teres-te ligado a mim e a todos os sentem este espaço como seu. sabe que serás sempre bem-vinda!
um beijinho!
Nossa, muito obrigada... De verdade , amei seu comentário !
ResponderEliminarSão pessoas singulares como você , que estava precisando ter nesse espaço ! ... Desse modo, fica evidente, vale a pena ter um blog !
adorei *--*
Muito bom, faz a gente refletir em cada estrofe.
ResponderEliminarAbs
gilson e sara, é um privilégio ter-vos cá, nesta viagem de destino incerto, sobre as águas da poesia.
ResponderEliminarum abraço a ambos!
Admirável poesia, Jorge, rica em imagens poéticas.
ResponderEliminarabrs!
ana, um agradecimento sentido. admirável, crê-me, é a tua/vossa presença aqui, dando sentido à escrita com e sem palavras.
ResponderEliminarum beijo!
"é preciso desinventar as palavras
ResponderEliminarpara sabermos quando é a hora de morrer"
e abrir os braços e não oferecer resistência...só assim se renasce
suspendeu-me o fôlego a leitura deste teu poema, jorge...e ao findar tive que ordenar-me: respira, respira!
belo, belo, belo! com a beleza de uma etérea mão a adentrar-nos o corpo até virar nossa alma pelo avesso
beijos mil, amado poeta!
Deixei de crer na bíblia faz tempo...
ResponderEliminarEmbora, seria mais confortador.
andrea, o teu lema é "à poesia se responde... com poesia".
ResponderEliminarse há palavras que não podem, por imperativo não sintáctico, mas humanista, ser desinventadas são as tuas, querida amiga. nunca! jamais! (eis o meu segundo manifesto, num intervalo de brevíssimos minutos).
um beijinho, poeta amiga!
também a deixei cair nos lugares vazios que se vão abrindo (ou permanecendo por fechar) dentro de mim... mas tenho mesmo de concordar contigo: tudo é mais fácil quando o olhar pousa nas suas páginas ali acoitando a esperança. eu sei-o; eu fui-o.
ResponderEliminarum beijo, vanessa!
A Procura nunca devia ser um cavalo de batalha, mas a nossa vontade sim... cavalo de batalha, quer dizer, animal que conhece a guerra e galopa em meio à guerra e o medo até chega a fugir dele...
ResponderEliminarum cavalo de batalha que cavalga no meio da guerra afugentando o próprio medo... palavras para quê? bravo, nãosoueuéaoutra! remeto-me ao silêncio da contemplação!
ResponderEliminarum beijo!
Jorge, conheci-o através da Zélia, nossa amiga em comum, e acabei por vir aqui conhecer o seu cantinho.
ResponderEliminarAmei o seu poema!...
Com mais tempo, voltarei à procura de mais pérolas iguais a essa.
Um abraço bem brasileiro
Cid@
olá, cida!
ResponderEliminaragradeço-lhe a visita e as palavras-estímulo que deixou pousadas no covés do viagens de luz e sombra.
queria que soubesse que amigo da zélia é meu amigo também! conheço poucas pessoas com a doçura e a delicadeza que ela asperge em todos os seus gestos.
um beijinho!
Travessias do inferno me remetem a Rimbaud, a aquele périplo de Dante Alighieri. E tu investes contra a linguagem e voas no universo da desconstrução, como se buscasses o vento que sopra as velas no abismo do próprio peito. Saga de muitos significados. Abração
ResponderEliminarAdmiro muito como você consegue trabalhar os versos...seu leque de possibilidades nõa só estéticas como também gramáticais...
ResponderEliminarE Tudo isso sem perder a sensibilidade da poesia...a musicalidade da poesia...a imagem da poesia...
abraço meu caro!
há um orfeu dentro de cada um de nós, amigo assis. a sua demanda só ele a conhecerá, mas se ousa descer a hades por ela é porque acredita valer a pena. a desconstrução da linguagem é inversamente proporcional ao agigantamento da odisseia individual.
ResponderEliminarum abraço!
ironia das ironias, juan: a tentativa de esventrar as palavras que apodrecem nos desertos da boca com... palavras. valha-nos a sensibilidade da poesia.
ResponderEliminarum abraço!
sempre atento às tuas intervenções que muito me tocam ou fazem reflectir; obrigado!
"...é preciso matar as palavras
ResponderEliminarafogá-las no seu veneno
fuzilá-las com a sua pólvora
apunhalá-las no seu cristal
apagá-las no seu rasto
riscá-las do poema
adormecê-las na sua insónia
trucidá-las no seu cinismo."
concordo plenamente! faço minhas as tuas palavras... talvez renascessem puras de vida!
Beijinho!
Jorge, pousar aqui me causa tamanha satisfação e dor no sair, pois o relógio corre e me tira do saboroso. É tanta musicalidade em teu manifesto, que sou remetida por uma renuncia: 'no desinventar as palavras para saber quando é a hora de morrer', afinal, morrer nos eleva em sangue e leitura incomum. Sua captura e articulação, faz-me pisar em cautela e detalhes, para que o feroz e monstruoso em mim não entre em cena. Pura delícia o que absorvo, pois é tanta resposta e pergunta que exala teu recanto.
ResponderEliminarAbraços ave rara!
Priscila Cáliga
andy, quando as palavras não bastam ou sobram, não basta cortar as mãos e coser a boca; temos de construir diques no coração e deixar secar as veias...
ResponderEliminarum abraço!
como te entendo, priscila... quando não conseguimos desinventar as palavras, resta-nos pisar os seus contornos com cautela, não vão elas despertar o animal que não aprende a morrer dentro de nós...
ResponderEliminarum beijinho!
Uau!
ResponderEliminarAdorei !
estou seguindo-te. ok?
Se puder dá uma passada no meu blog.
Desinventar é treinar o olhar para múltiplas mortes e múltiplos renascimentos.
ResponderEliminarBeijos, meu caro!
É preciso desinventar a nós mesmos, para sabermos quando é hora de viver. Porque de morrer, a cada dia, sabemos um pouco mais.
ResponderEliminarLindo poema, Jorge.
Obrigada pelo carinho de sempre. Ainda estou sem o computador, mas qualquer tempinho a mais, mergulho por aqui.
Uma beijoca, querido
Jorge, no último album dos Mão Morta vais encontrar o seguinte: "mais vale morrer do que não nascer nem morrer".
ResponderEliminarAcho que está dito!
Mas não te preocupes, há sempre o renascer!
Beijo
Laura
E depois ficamos só com os silêncios....
ResponderEliminarGosto sempre do que escreves...
Beijo Jorge
viva, steven!
ResponderEliminarobrigado pela visita e pela simpatia das palavras. Passo no teu blogue com imenso gosto.
um abraço!
também vejo as coisas assim, lou. renovar, renascer, reaprender, re... o pior de tudo é quando a capacidade não acompanha a vontade...
ResponderEliminarum beijinho!
é bem verdade, querida sylvia, morremos um pouco a cada dia que passa. nem sempre sabemos é fazê-lo...
ResponderEliminarum beijinho! fico mesmo contente por te ver por aqui.
pois, os mão morta, que durante anos não foram levados a sério, são, na verdade, uma banda com um substrato inquestionável, hoje. obrigado por me recordares que há vida para além das palavras (ainda que precisemos das palavras para o dizer e saber).
ResponderEliminarum beijinho!
magnólia, obrigado pelo teu carinho sempre presente. deixo-te um beijo... em silêncio!
ResponderEliminarJorge, meu querido
ResponderEliminarQuem sabe, desinventar as palavras gastas, puídas, viciosas que temos e inventar outras que fossem novinhas, em folha...
Perdoe-me, amigo, se saio do território do seu lindíssimo poema e invado um obscuro canto onde minha vida se desenrola e faço um desabafo muito particular: uma grande amiga minha vive um momento dificílimo e eu, ainda que deseje ardentemente consolá-la, não o consigo, quando tento fazê-lo com as minhas amarfanhadas palavras ...
Perdoe-me querido... Contigo tenho esta liberdade...
Mas, viremos a página: Outro dia, num outro lindo poema, você já estava magoado com as palavras; já tinha suas queixas... Hoje, mostrando o desgosto aumentado, nos presenteia com esta obra-prima. Monumental poema!!!
Ah, Jorge, que seria ter uma avalanche de palavras inéditas à disposição dos versos...
Beijo, amigo!
sabes, amiga zélia, tenho uma relação de amor-ódio com as palavras. há momentos em que lhes grito no tom em que sinto que elas o fazem comigo; nesse então, vejo-as como meros intermediários, usurpadores do coração e do sonho, traidores de ideias e sensações, filtros imperfeitos. No entanto, no auge do arrufo, sinto-as a sorrir, timidamente, como se fossem crianças pedindo desculpa pela mais inocente traquinice; quando mantêm a birra, sou eu que, sentindo falta da vertigem, corro para os seus braços, lambuzando-as de beijos e afagos.
ResponderEliminaré então que nova crise de ciúmes emerge: o silêncio baixa os olhos, tomba a cabeça e, cabisbaixo, retira-se, ofendido pela minha indiferença...
e balanço, de novo, entre dois amores...
um beijinho grande e sentido de alguém que sente a singularidade da pessoa que és!
passo um dia sem vir aqui e fico me penitenciando pelo tanto que perco.
ResponderEliminarfelizmente, sei que os amigos perdoam.
sim, jorgíssimo... pelas ausências, minha penitências...rs
abraço você!
(Só agora me dou conta do tempo que não vinha aqui, beber dessas palavras.)
ResponderEliminarCoisas de desconstruir, desaprender, para reaprender a reconstruir. Há algo que lembrou-me Eros e Tânatos, mas, sobretudo a Fênix.
Grande abraço e muita admiração.
P.S.
Depois, se puderes, me diz qual o link do fotógrafo - José Figueira, tá bem?
mai, as palavras que aqui repousam tornam-se maiores quando tocadas pelas tuas, sempre tão oportunas e invocativas de trilhos mil... leio-as e releio-as no balanço das pernas galgando os horizontes para que apontas.
ResponderEliminarum beijinho!
Aqui vai o endereço do blogue do josé figueira: http://photoscriptos.blogspot.com/