hoje foi o dia mais quente do ano.
o calor banhou-se no meu corpo
(já não são só as veias
(já não são só as veias
a arder dentro de mim).
senti as pétalas da boca
a apodrecer na jarra
que manténs sobre a cómoda do quarto
e rasguei as gengivas com dentífrico
e as mãos com pedra-pomes.
é verdade,
senti o corpo em queda livre
na respiração vertical da estrofe
onde não depusera rede e colchão.
pior que tudo,
o odor a frutos vermelhos
mancha-me os sentidos
como balões de hélio que não sabem subir.
não me torno mais triste
(talvez um pouco pedra).
sei que os poemas agitam veneno
e carregam o diabo no corpo.
e carregam o diabo no corpo.
hoje, no dia mais quente do ano,
comecei a rasgar poesia.
"não me torno mais triste
ResponderEliminar(Talvez um pouco pedra)"...
Sabe, às vezes também me sinto assim, mas não sabia me expressar...rs
As coisas passam por mim, mas não me atingem, pois para escapar do sofrer, endureço o coração e me torno pedra...
Será que assim a gente escapa mesmo do sofrer?...:) Doce ilusão!...
Jorge, rasgue suas poesias, somente poeticamente, nunca literalmente.
Por favor!...rs
Abraço verde, amarelo e azul (da cor da minha bandeira)
Cid@
"sei que os poemas agitam veneno
ResponderEliminare carregam o diabo no corpo."
Palavras inteligentes... ! É assim mesmo que seus versos são,
CONTAGIAM, e fazem "agente" querer pensar,
refletir, entender ! E carregam sentimentos e esses se impregnam ... !
: )
ah poeta fez-se incêncio na alma com rasgos no coração. a poesia se alimenta de recortes e fragmentos. ser de pedra soa poético, como uma aliteração. grande abraço
ResponderEliminar"senti as pétalas da boca
ResponderEliminara apodrecer na jarra
que manténs sobre a cómoda do quarto..."
belíssimo! aliás difícil é, escolher a parte mais bela...
hoje, no dia mais quente do ano...
ResponderEliminarvocê incendeou o mundo com sua poesia.
beijão pra ti, meu poeta favorito em braga, capital mundial de jorge pimenta!
quem rasga sempre renasce. SEMPRE, quer dizer às vezes. eu tive a ousadia de puxar fogo a quase 3 mil páginas há alguns anos... fi-lo em plena rua - jardim - e foi um voo de cinzas... o vento, o vento e, a sorte, foi ser em meio bucólico - confesso, que me arrependo subtilmente. eram tantas coisas escritas sobre tantas coisas. há ilusões estranhas que nos acometem de repente. mas não penso muito nisso. -
ResponderEliminarmais um poema a descer pela goela-estrofe
"é verdade,
ResponderEliminarsenti o corpo em queda livre
na respiração vertical da estrofe
onde não depusera rede e colchão."
perfeita descrição!
adorei...
beiijo
*.*
"hoje foi o dia mais quente do ano"..."comecei a rasgar poesia"!
ResponderEliminarO sangue borbulha nestes dias!
Belissimo
abraço
importante que o veneno se agite por dentro e ao sair, abra fissuras na rocha...
ResponderEliminarnão há pedra que resista a tua poesia rasgando-se em versos tão intensos
beijinho, querido poeta!
cida, o coração endurece e perde a sua flexibilidade; cristaliza, assim, um estado vegetativo em que a mágoa e a dor se consolidam.
ResponderEliminarantes não se petrificasse, nunca. seria, com certeza, a forma de passar pelos diferentes estados adaptando-nos às circunstâncias várias.
um abraço!
sara e andy,
ResponderEliminaro que me toca especialmente é a vossa presença assídua e sentir que a poesia, genericamente entendida, é uma flor em permanente renovação no coração de cada uma de vocês. agradeço a distinção de, passando por cá, incluírem alguns dos meus textos no vosso canteiro sensorial.
um beijinho a ambas!
ah, poeta, ah, assis, só tu para responderes à poesia com a poesia!
ResponderEliminarser de pedra soa poético tantas vezes, mas... o pior é quando se torna mancha solar na pele que se alitera, reitera, em cadência anafórica. nenhum médico saberá como tratá-la e o sol já só a pode adensar... viaja-se rumo à penumbra, num assomo de desespero, e descobre-se que, às escuras, a mancha não se vê... mas continua lá... irónico, não?
um abraço, amigo!
primeiríssima pessoa, de incêncio em incêndio, sabe que também tu carbonizaste toda esta página, com ventrículos e aurículas. é a força das tuas palavras, mas sobretudo a da amizade que sabes cultivar... sempre!
ResponderEliminarum abraço!
mas teve um custo elevado, esse desejo incontrolável de renascer, não, nãosoueuéaoutra?... e o arrependimento?... talvez nunca nos libertemos, totalmente, daquilo que nos definiu e, nessa perspectiva, talvez o renascimetno não seja, nunca, completo. (eu tenho a certeza de que não).
ResponderEliminarp.s. se fosse hoje, queimarias os papéis, mas continuarias a ter tudo diante dos olhos, nas páginas do blogue.
um abraço!
grafite e juan, só mesmo os vosso carinho verbal para me dar o alento de que qualquer coração carece para jamais se tornar pedra...
ResponderEliminarum abraço a ambos!
oh, querida andrea, até a pedra mais dura e resistente se verga à sensibilidade das tuas palavras e do teu coração...
ResponderEliminarum beijinho!
Literalmente falando, não rasgue poesia.
ResponderEliminarMetaforicamente, tudo bem :)
não seria capaz de o fazer literalmente, vanessa... até porque a poesia se (ins)escreve num tecido que se gasta, que envelhece e que morre... sem nunca se rasgar.
ResponderEliminarum beijo!
ah, jorge, se assim fosse...tivesse eu a capacidade de alcançar o que por dentro de uma rocha se esconde...mais nada quereria...não teria perdido a pele, o brilho, o riso
ResponderEliminarfoi assim:
"É essa minha mania de ver as coisas pelo avesso...de enxergar as pessoas por dentro...
Olhei e vi logo a alma clara, as asas, a cor, nem percebi os muros que havia em volta...
Vi mar profundo e mergulhei...não enxerguei as rochas que o protegiam...
Foi assim que perdi minha pele,
Tentando alcançar o que eu enxergo, esfolando meu corpo contra o rochedo que eu não via..."
nunca se deixe cristalizar em rocha, querido amigo, ela aprisiona as asas, os versos, a alma...é a morte mais triste que conheço.
beijo em seu lindo coração e em sua alma que se agita em vida!
"Não rasgue a poesia, deixa-a morrer dentro de sí, pra sempre!"
ResponderEliminarPs: Publiquei aquela foto preciosa que tu me enviou, não canso de olhar... :-)
beijos amigo, e aquele abraço...
há uma diferença entre a pedra de que falo e a que mencionas, querida amiga andrea: a assunção da petrificação;. quero com isto dizer que, enquanto num caso ela é reconhecida e reconhecível, no outro ela é encoberta e dissimulada. aquele que saiba que mudou e o tenha consciente, não engana nunca... já o outro...
ResponderEliminarp.s. não, querida amiga, a única pedra que vive dentro de mim está no nome: rocha pimenta são os meus apelidos :)
um beijinho!
...Ou a rasgar a pele
ResponderEliminarBeijo
a poesia vive dentro de mim, de ti e de todos aqueles que nos visitam, amiga márcia! jamais a rasgaria, pois estaria a sonegar a essência. os únicos rasgões estão no tecido orgâncico onde tantas vezes a poesia é escrita... mas até esses hão-de ser cosidos com boa mão e muita paciência... assim o espero.
ResponderEliminarum beijinho!
p.s. fiquei sensibilizado com a imagem publicada no teu blogue e, sobretudo, com as palavras carinhosas que tu, o roberto e o pedro me dispensaram... fiquei verdadeiramente atrapalhado :)
é como quando se é miúdo e se desce a ladeira de bicicleta a toda a brida e, no segundo inesperado, a roda derrapa sobre a areia indolente que a lambe com amoras aciduladas. no final... é como dizes: é a rasgar a pele.
ResponderEliminarum beijinho, magnólia!
Jorge, querido
ResponderEliminar"hoje foi o dia mais quente do ano."
Encantei-me com esse início e viajei. Fui até Eliot, no início do seu West Land: abril é o mais cruel dos meses...
Uma frase inicial, assim como a sua, só poderia, mesmo, resultar num lindíssimo poema...
E fico encantada com a mistura que promoves entre o trivial e os sofisticados elementos...
Você é imbatível!!!
Beijinhos
querida zélia, aí está mais uma afinidade nossa: o gosto por elliot. no meu caso, um dos autores mais marcantes e decisivos na definição de um estatuto (seja ele qual for) poético. ele sim, um gigante... eu apenas brinco (e mal) com as palavras que mo deixam fazer...
ResponderEliminaragradeço a imbatível (no teu caso, sem sombra de dúvida) simpatia das tuas palavras e gestos!
O poeta é mesmo um fingidor
ResponderEliminarpedra por fora ameixa por dentro
amadurecendo no dia mais quente do ano
no calor das palavras com que ilumina a sombra nos versos que lhe escapam pelos dedos incapaz de os prender e de os rasgar.
Ainda bem. Assim os dias ficam mais claros e os fantasmas que habitam a noite apaziguados.
Parabéns, Jorge. Continuas em forma.
Abraço.
"senti o corpo em queda livre
ResponderEliminarna respiração vertical da estrofe"...
Traduz a sensação de quando somos invadidos pela poesia.
Um poema que incendeia.
Beijos
e eu é que continuo em forma, jad? por aqui fez-se silêncio enquanto o teu poema-resposta desfilou diante dos meus olhos. obrigado, meu caro!
ResponderEliminarum forte abraço!
quantas vezes queria deixar-me arder com ele, lou... talvez por isso tenha escrito, hoje,
ResponderEliminar"a hora é frágil
e o olhar apenas travesti macilento
suplicando pelo espelho:
no deles, a vida em combustão.
no meu, o pesadelo de não saber arder."
haja Inquisição e autos-de-fé para os poetas!!!!!!! (ok, é apenas úma metáfora :)).
um beijo!
Belíssima fotografia!
ResponderEliminarEstar pedra é recurso de sobrevivência e - até que novas águas venham - é inspiração poética. Há pedras de frio e calor, mas tudo à noite, arde e nessa hora é preciso saber deixar-se...
ResponderEliminargrande abraço
as palavras que pousas sobre as minhas têm o condão de as levitar no ar, fazer girar, fazendo exibir novos ângulos que se encontravam fechados no momento em que o traço rasgava o ventre da terra. obrigado, querida mai!
ResponderEliminarum abraço sentido!