Foi justamente isso que sucedeu ontem, na Escola EB 2/3 de Viatodos – a minha escola. Para encerrar o ciclo dedicado ao livro e à leitura – Semana da Leitura –, profusamente ilustrado com palestras, encontros com escritores, feira do livro e testemunhos poéticos, decidiu-se juntar um grupo de pessoas que assegurasse, como franja comum, um só requisito: o gosto pela poesia.
Surpresa (ou talvez não), acorreram a este evento cerca de cinco dezenas de professores, alunos, pais e encarregados de educação, para lá de gente sem vínculo directo à escola, que, em roda, invocaram nomes grandes e anónimos da poesia do mundo. A acompanhar as palavras dedilhadas pela orquestra dos lábios, o chá, que, escorrendo pelas gargantas, ajudava a invocar Pessoa, Garrett, Nuno Júdice, Sousa Braga, para além de jovens que, em exercícios poéticos experimentais, iam, na sua inocência, clamando a verdade maior de todas: a de que é na/pela palavra que se dá sentido à existência humana.
A dar colorido à sessão, tivemos o actor Armindo Cerqueira que declamou, representou e encantou, ora ao som da guitarra domada pelo também poeta Flávio Silva, ora nas notas enfeitiçadas pelos dedos frágeis de petizes de 10/11 anos.
No final, nos olhares seguros e luminosos de todos bailava uma só certeza: a de que homenageando a poesia, se havia homenageado o próprio Homem e a sua realização maior. É que “quem ama, tem o seu deus em dia” (verso retirado de um poema de Flávio Silva).
Os dois poemas por mim escolhidos para declamação:
ATÉ AO FIM
Mas é assim o poema: construído devagar,
palavra a palavra, e mesmo verso a verso,
até ao fim. O que não sei é
como acabá-lo; ou, até, se
o poema quer acabar. Então, peço-te ajuda:
puxo o teu corpo
para o meio dele, deito-o na cama
da estrofe, dispo-o de frases
e de adjectivos até te ver,
tu,
o mais nu dos pronomes. Ficamos
assim. Para trás, palavras e versos,
e tudo o que
não é preciso dizer:
eu e tu, chamando o amor
para que o poema acabe.
Nuno Júdice
PAIXÃO
Podia escrever o teu nome num vidro embaciado ou segredá-lo a uma borboleta negra.
Podia cortar os pulsos e deixar o sangue correr até que o mar ficasse vermelho.
Ou beijar-te os pés. Mas esse gesto está reservado desde o princípio dos séculos e teria o sabor de uma profanação.
Jorge Sousa Braga
Poesia, sorrisos, música, amigos... Belo sarau!Bons momentos a repetir! Gostei dos poemas escolhidos para "abrir as hostilidades" :))
ResponderEliminarbeijinho
Concordo em absoluto. Qualquer motivo é bom para se fruir da companhia dos amigos. Se for a poesia, é ainda melhor! Quanto aos poemas que abriram as hostilidades, são, apenas duas pérolas de dois dos maiores da contemporaneidade. Concordarás comigo.
ResponderEliminarAh, a propósito, se tu e a Rosa fossem declamar, escolheriam cantigas de escárnio e maldizer, certamente, hihihi!
Beijinho!
Eu sei bem o que escolheria! :) Nós somos pessoas atentas e críticas, apenas isso... Mas diz lá se não te divertias com o que ouvias?!~
ResponderEliminarBeijinho!
pois sim! diria que muito críticas... e pouco atentas, hehe!
ResponderEliminarbeijinho!
Eu como docente de História...tenho convicção que a única coisa que pode dar uma formação ao aluno é a literatura...
ResponderEliminarBelo post meu caro...Nos instiga em busca de novas propostas dentro de uma organização tão complexa que é uma eascola...!
Abraço
Eu como docente de História....tenho convicção que a única coisa que pode dar uma formação ao aluno é a literatura...
ResponderEliminar...Belo post, nos instiga a buscar novas possibilidades dentro de uma organização tão complexa como uma escola1
Abraço
Professor...
ResponderEliminarParece ter sido uma noite muito especial.
Te mostras um professor encantado com as letras.
Respeitosamente impressionada.
Concordo contigo, Juan. Todas as áreas são indispensáveis para o equilíbrio do Homem, estejam elas mais vocacionadas para as humanidades, artes, ciências ou tecnologias. Cada uma delas se centra numa das partes que o constituem: as ciências - o cérebro; as tecnologias - a mão; as artes - o rosto; as humanidades ( e a poesia em particular) - o coração e toda a máquina volitiva que nos faz girar.
ResponderEliminarUm abraço, Juan!
Foi, na verdade, uma noite muito especial, "Mulher na Polícia". Qualquer evento em que a todos una um propósito é respeitável; quando o propósito é a poesia, torna-se grandiso!
ResponderEliminarUm abraço!
Adorei aqui,
ResponderEliminarestou seguindo ;D
beiijo
Que maravilha Jorge, a poesia abre as asas sobre nós. Que se cultive o hábito. Grande abraço.
ResponderEliminarObrigado, Grafite. Passei lá no teu blogue, também. Lugar bem acolhedor, o teu!
ResponderEliminarBeijinho!
Assis, uma noite muito agradável, onde todos os poetas - os declamados e os por declamar - estiveram presentes. Senti-te por lá, caro Amigo! A ti, ao Roberto, à Andy, à Laura, à Márcia, ao Pedro... e a tantos outros que a deixam a poesia respirar pelos poros do coração!
ResponderEliminarUm abraço!
Ah, a minha escola!!!Ex!
ResponderEliminarReconheço o local e algumas caras!
Beijos!
Laura
Verdade, Laura, a nossa escola. Sempre!
ResponderEliminarHihihih, até me esqueci de agradecer!
ResponderEliminarE adorei os textos que escolheste!
Beijos
O que é teu de legítimo direito não carece de agradecimento.
ResponderEliminarBeijo, Laura!
Duas fantásticas escolhas...dois poemas lindissimos , Jorge
ResponderEliminarBeijo
belas escolhas, meu poeta bracarense...
ResponderEliminarmesmo porque, adoro nuno júdice...
bom mesmo foi ver tudo isto reunido com fotos e a presença de pessoas no sarau.
reagimos, poeta...
reagimos...
abraços do seu amigo das geraes, o
roberto.
Nuno Júdice e Jorge Sousa Braga são dois dos poetas que mais me enchem as medidas, Magnólia. Em registos diferentes, conseguem, pelas mesmas formas, chegar ao coração dos homens.
ResponderEliminarUm beijinho!
Também adoro Nuno Júdice. Acaba de publicar um novo livro de poemas e eu de comprar uma verdadeira preciosidade: a sua Antologia Poética!
ResponderEliminarE Jorge Sousa Braga, conheces? Vale bem a pena.
A propósito, acabo de encomendar o livro do F. Sabino que me recomendaste. Não sei ainda se existe, mas deram-me boas perspectivas de mo arranjarem. A ver vamos.
Um abraço, Roberto de Minas, Nova Iorque e do mundo!
Vamos ver se eu entendi bem, tu querido Jorge leste este dois poemas num recital? Ou seja, o poema lendo o poema,seria isto o que chamam de metalinguistica?
ResponderEliminarDeus! E eu aqui do outro do mundo perdendo-ti, perdendo-me.
Metalinguagem é a tua voz flectida sobre si mesma, deixando escorrer não palavras, mas a doçura vermelha dos mais delicados frutos.
ResponderEliminarUm beijinho, querida Amiga Cristiana (desejando que estejas bem!)
Querido amigo que saudades de ti.
ResponderEliminarO que é o oceano que nos separa? A representaçao da minha saudade?
Mando-te um poema do Benedetti, ontem eu o ouvi e pensei: no se quien soy, ni donde me dirijo...
No se quien es ( Mario Benedetti)
Es probable que venga de muy lejos
no se quien es ni a donde se dirige
es solo una mujer que se muere de amor
se le nota en sus pétalos de luna
en su apariencia de algodón
en sus labios sin besos u otras cicatrices
en los ojos de oliva y penitencia
esta mujer que se muere de amor
y llora protegida por la lluvia
sabe que no es amada ni en los sueños
lleva en sus manos sus caricias vírgenes
que no encontraron piel donde posarse
y como huye del tiempo su lujuria
se derrama en un cuenco de cenizas.
escrevi metalinguistica ao inves de metalinguagem,rsrsrs
ResponderEliminarestou aqui a ler, um livro sobre linguistica aplicada, ja nao aguento mais,confudo-me toda.Chega de linguistica, meta, aplicada, desaplicada,rsrsrs
Como diria o poeta:vamos vir de brisa...
Belíssimo, Amiga Cristiana! Todavia te asseguro que quem tanto ama não acaba apenas protegida pela chuva... também o destino lhe estende a mão... mais cedo ou mais tarde.
ResponderEliminarUm beijinho com a brisa aplicada :)
Meu querido Jorge
ResponderEliminarReceber sua visita foi muito bom. Seus comentários mostraram-me que a poesia vale a pena. Encontrá-lo entre os meus seguidores, foi pura emoção. Senti-me honrada! Obrigada.
Agora, quando chego aqui , encontro esta postagem maravilhosa. Posso imaginar, perfeitamente, quão feliz você esteve durante o evento que nos mostra. Sarau é programa adorável, que faz bem ao espírito. Você foi felicíssimo na escolha dos poemas! Lindos!
Sou, também, da área da educação: dediquei quarenta anos de minha vida ao ensino. Então navegamos, nós dois, nas mesmas águas, e isso muito me alegra!
Um grande abraço
PS- E as águas nas quais navegamos são entremeadas de poesia... Ótimo, não?
Jorge,
ResponderEliminarPelos poros do coração: como melhor respirar-se poesia? Inda mais num sarau onde poemas declamam poemas, declamam-se a si mesmos os amantes incuráveis da boa palavra, vivíssimos versos em suas mãos em chamas! A cruzar iria a nado o oceano por estar-me aí, amigo. Mas estive, na símplice lembrança do meu nome à tua boca! E sinto-me honradíssimo por tal merecimento! Que evento grandioso, poeta! E por quê o não repetirmos, sob a batuta do Roberto (certamente que ele topará a empreitada), em BH, capital das Minas Geraes, a reunirmo-nos em família os amigos que já se frequentam pelos blogues, em propícia data a ser consultada a todos? Fica aqui minha tímida ideia, seu Jorge! E minha admiração pelos poemas escolhidos para serem declamados Ti não poderia deixar de ser a maior também!
Abraço poético,
Pedro Ramúcio.
Obrigado pelas palavras de aragem serena, Zélia. Sinto uma alegria imensa ao perceber como, à distância de tantos quilómetros, se nos torna possível aproximar sensibilidades, ideias e, sobretudo, palavras - que são, afinal, as pessoas! É quase como que uma tertúlia, esta, em que nos cruzamos, quase como se fôssemos pessoas que acabam de se cruzar ao fundo da rua e sabem que no dia seguinte se voltam a encontrar numa qualquer mesa de café ou trilho de jardim. Se dúvidas houvesse acerca da grandiosidade da poesia, elas, por isto só, estariam perfeitamente desfeitas.
ResponderEliminarÉ, na verdade, um prazer ver a nave em que viajamos crescer com pessoas que sentem a vida nas crinas da palavra. Obrigado por isso!
Um beijinho!
Uma (in)confidência, Amigo Pedro: estiveste presente não apenas nos poros do coração. Estiveste (e estás, ainda) materialmente, pois distribuí pelos lugares mais inusitados da escola (uma árvore, uma janela, um caixote, um banco de pedra...) poemas de diversos autores e lá tens o teu, também. Pedro Ramúcio, o poeta, ao lado de Pessoa, Al berto, Cesariny...
ResponderEliminarPois, para quando a reunião desta tertúlia? Combina com o Roberto, sim. Quem sabe eu, a Laura e outros combinamos aquilo que seria, em si mesmo, a mais pura poesia: a reuniãom dos amigos.
Um abraço!
ô, jorge...
ResponderEliminarmeu menino da rama, finalmente começa a andar em boa companhia... rs
comigo?
álcool, drogas, mulheres... comidas calóricas... lugares mal-situados... brigas com a polícia... passarinho de uma asa só, a da esquerda...
e, cê ja viu passarinho de uma asa só levantar vôo?
mas meu menino da darama, tá voando.
com as mil...
asas que a poesia lhe deu.
esse encontro tá marcado? onde? quando? onde é que eu assino? rs
* postei isso la no ramúcio... a idéia é boa, sim. e é pra ser amadurecida. mas ao invés de bh, terra de líria porto, governador valadares, terra de ramúcio (e minha, também)... podemos conversar com as autoridades locais... com a universidade...
vixe... ta me dando uma "coceira"...
Bora lá! Assino de letra.
ResponderEliminarUm abraço, Roberto Amigo!
viva caro poeta jorge pimenta!
ResponderEliminargrato por evocacar a tal frase que te ficou na memória, pois é de memória e com memória que os dias se salvam. a tua poesia é de facto uma memória futura, uma saudade do futuro onde o leitor se encontra projectado para lá da fronteira do imaginário. (até parece um prefácio).
o sarau foi muito agradável e é sempre louvável estas iniciativas. vou então enviar o tal convite para poderes participar no blogue do movimento às artes e , outros que queiram, basta enviar pedido para o correio electrónico.
com certeza quer esta casa será sempre uma casa de visita.
abraço
Viva, Poeta Flávio Silva!
ResponderEliminarAguardava ansiosamente pela tua visita.
Agradeço-te, antes de mais, o quase-prefácio (hehe) com que fazes ruborizar a minha poesia.
O sarau foi um lugar de convergência de sensibilidades que tinham, acima das diferenças, o gosto comum pela poesia. Houve, na verdade, momentos que me marcaram muito especialmente. Um deles, o teu poema (definitivamente bonito!) e, muito particularmente, aquele tal verso.
Obrigado pela visita. Conto voltar a ver-te por cá. Fico então a aguardar o envio do endereço.
Um abraço!
Quem me dera que os meus alunos ficassem parados alguns minutos para ouvir poesia... =D
ResponderEliminaro regime de captação da audiência era o voluntariado, Priscilla. Só lá estava quem queria. e quem quis, desfrutou.
ResponderEliminarum abraço!
muito bom!!
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