sexta-feira, 7 de maio de 2010

cor[o]ação

foto de José Figueira

um fruto verde consome a minha voz
e é o silêncio que se estende sobre os lençóis
onde outrora depusemos rosas encarnadas.
boceja com veneno na língua
como se nada mais existisse no quarto
e todos os nomes definhassem na estreiteza do corpo.

contra a luz
árvore e flor esperam a hora de morrer
enquanto o desejo perde a boca e o palato
(o coração há já muito se perdeu
sobre as planícies lavadas pelos versos
de uma chuva que não soube molhar).

desaprendi de escrever
(talvez aprenda a morrer):
a poesia deixou de arder nos olhos
e eu já não sei roer o mel que estala nos dedos
a poesia esqueceu os rios que enxaguam o rosto
e eu desprendo as amoras dos lábios
a poesia lançou a verdade aos ataúdes
e eu já não sei como saciar a mão.

afinal, tinhas razão:
todas as palavras juntas
escrevem o mais sórdido dos silêncios.

32 comentários:

  1. Jorge querido

    Lindíssimo poema!

    Sua poesia (de tão envolvente)deixa-me tonta... Na tentativa
    de encontrar-lhe a ponta do fio , insinuo-me num labirinto de emoções, e vou rodopiando, rodopiando, numa dança louca, desenfreada, frenética, até que me dou conta
    de que estou, já, de volta ao primeiro verso. E isso vai-se tornando um círculo contínuo do qual não quero sair....
    Poesia imantada! Maravilhosa!

    Beijinhos

    PS- Sua visita encantou-me...
    Obrigada.

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  2. meu sublinhado imaginário:
    todas as palavras juntas
    escrevem o mais sórdido dos silêncios.

    Muito bom.

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  3. Zélia, tenho viajado regularmente até ao seu porto de abrigo, porque a sua poesia me encanta. Conjuga a sensibilidade com a agudeza de espírito, tornando os seus textos irrepreensíveis.
    Agradeço-lhe as palavras sobre o meu texto. Creia-me que me arrepiaram.
    Um beijinho!

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  4. Obrigado, Dryka. Volte que cá a estaremos a esperar com enorme satisfação; eu e todos aqueles que sentem este blogue como seu, também.
    Um abraço!

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  5. Mas as tuas, Vanessa, rasgam o silêncio.
    Um beijinho!

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  6. jorgíssimo,
    uma vez mais, feliz casamento de texto e imagem.
    como dizemos em minas... você num é fraco, não.

    abraços,
    roberto.

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  7. Uauauaua. Texto forte...mui forte. Gosto assim, com sensibilidade e não perdendo a personalidade. Impressionante. Gostei muito. Posso voltar outras vezes? Parabens.

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  8. Jorge, faço minhas as palavras da Zélia...
    tua poesia me encanta e me entontece.

    beijos

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  9. Como sempre meu caro você conseguiu nos surpreender e nos fazer perder em suas palavras...!

    Abraço

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  10. Riff! O-bri-ga-do!
    Se pode voltar? é imperioso que volte. É um privilégio, para mim, tê-la por cá.
    Um abraço!

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  11. Robertílimo, a imagem é de um bloguefriend com quem me cruzei na net; depois de contactado, autorizou-me a usar as suas fotos. São fantásticas! Quanto ao texto... foi o que saiu, querido Amigo. Fico contente por "num ser fraco", hihihi!
    Um abraço desde Braga!

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  12. Andrea, a sua presença, sensibilidade e simpatia são já um dos trunfos deste blogue. Não imagina o quanto me sinto honrado por isso. Obrigado!
    Um beijinho!

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  13. O coração sente-se cor(o)ado. Perfeita alquimia de versos. Como um trunfo na manga, a palavra certa, voilá. Abraço poeta.

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  14. Assis, o mestre das palavras, seja no maior dos poemas, seja no mais singelo dos comentários. Tudo, na sua escrita, se torna grande!
    Privilégio, Amigo, é tê-lo por cá.
    Um abraço com poesia!

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  15. Caro Juan, percamo-nos nas palavras; reencontremo-nos nos afectos. Aqui. Aí. Sempre!
    Um abraço sentido!

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  16. Jorge, está na altura de tu saires do quarto. (eu preciso de ir dormir para lá!)
    Beijos
    Laura

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  17. nem penses, lauríssima, "o sonho caiu da cintura dos deuses", mas nós, nós... nós somos homens. brindemos á errância e à imperfeição que nos distingue.
    um abraço!

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  18. obrigado, magnólia!
    venho do teu blogue, que está cada vez mais irresistível. pequenos posts, com uma elegância e uma articulação irrepreensíveis.
    um beijinho!

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  19. "desaprendi de escrever
    (talvez aprenda a morrer):
    a poesia deixou de arder nos olhos
    e eu já não sei roer o mel que estala nos dedos"

    lindo demais!!
    você escreve muito bem!! :D

    beiijo

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  20. é, por vezes, mais difícil desaprender que aprender, Grafite...
    beijinho!

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  21. jorge:
    não tenho tido tempo para visitar e comentar.logologo volto ao ritmo.procura por ti lá no meu canto,

    volto depois com mais tempo.
    quanto ao último poema e fotografia *****
    beijo

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  22. acabo de passar pelo teu blogue e de sentir o carinho que deixas a todos aqueles que te seguem e que sentes, já, como alguém próximo. obrigado, Em@! sente-o aqui também!

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  23. Um agradecimento especial e um beijinho desde este lado do Atlântico, Cris!

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  24. bom dia!
    mais um poema feito com suor e sangue
    abraço

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  25. Viva, Flávio!
    Suor e sangue?... não é assim a poesia?... e a vida, então?...
    Um grande abraço!

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  26. Caramba!! Que despedida de si mesmo...queda livre, né? Gostei...muito bom!

    []s

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  27. "desaprendi de escrever
    (talvez aprenda a morrer)
    (...)
    afinal, tinhas razão:
    todas as palavras juntas
    escrevem o mais sórdido dos silêncios."
    APENAS: VC EH INCRÍVEL!
    ;) bjs***

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  28. Caro pimenta,
    aqui estou pra agradecer tua réplica do comentário em viagens de perímetro curto - é gentil, é necessária, é verdadeira; mas quem é, então, que está diante de mim neste instante? Não tenho a menor ideia. Então, te procuro por aqui e te vejo maior: ideia.

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