Estreou em 2004, mas, como a generalidade dos grandes filmes que não dispõem, na retaguarda, de uma máquina comercial poderosa, terá passado despercebido do grande público; falo de Crash.
Num mundo pluricultural, pluriétnico e de grande diversidade moral (de que o melting pot norte-americano é o expoente maior), o racismo, a intolerância e o egocentrismo são apenas pretextos para se tocar no que de mais profundo move o ser humano: as relações interpessoais.
Partindo de um frame narrativo muito em voga na cinefilia actual, Paul Haggins apresenta-nos não apenas uma galeria de actores (excelentes, diga-se), mas, sobretudo, de pessoas, feitas de carne e osso, corpo e alma que, como qualquer um de nós, independentemente do seu estatuto e das suas valências, tem "crashes" na vida. Temos, assim, diferentes estórias paralelas que, ora nos pequenos detalhes, ora nos grandes cometimentos, cruzam destinos, num exercício psicológico e social que (até porque bem suportado numa banda sonora arrepiante, da autoria de Mark Isham), chega a atingir níveis de dramatismo verdadeiramente perturbadores.
A ideia maniqueísta que durante anos a indústria cinematográfica vinha vendendo, sugerindo que no mundo apenas havia dois tipos de pessoas - os bons e o maus - cai redondamente por terra neste filme. Estamos perante um registo humanizado do indivíduo (na sua relação consigo mesmo e com os outros) que, quando confrontado com diferentes desafios, pode reagir como lobo ou cordeiro. Esta ideia é tranversal, já que cruza todas as personagens, diria que fatal e irreversivelmente. Assim, da redenção à queda ou da queda à superação vai um instante tão breve quanto todos os que separam os grandes valores da espécie humana.
No final, a certeza de que o acidente (Crash), que simbolicamente abre e fecha o filme, acaba por todos tocar, mais cedo ou mais tarde, inevitavelmente.
In the Deep, Bird York (from Crash)
Aqui você faz a resenha ou sinopse de um bom filme. Porém, mais que isto eu li idéias, com as quais concordo.
ResponderEliminarNão somos 'bonzinhos' simplesmente, ou maus definitivamente. A questão da sobrevivência, da alteridade, dos valores, da diversidade parece correr como veios de rios em direção à foz.
Mas há obstáculos e desafios a vencer.
Ironicamente, em meio aos avanços tecnológicos, acumulamos tanto 'lixo' que talvez não saibamos quanto tempo, como ou onde chegar.
A incivilidade avassala a espécie e o mundo.
Bela trilha.
abraços e bom final de semana.
faço parte das talvez poucas pessoas que não viram o filme referido, despertaste a minha curiosidade...bela música e vídeo. A propósito, parabéns pela casa cheia! :)
ResponderEliminarBjinho!
é o cinema para mim assim, Mai: conflito, perturbação, inquietação, dilemas, questões e... poucas respostas. como a vida, afinal.
ResponderEliminarpois, querida Amiga Andy, procura ver. crê-me que pela história, pela realização, pela interpretação e não menos pela música é uma obra marcante.
um beijinho a ambas!
Jorge
ResponderEliminarQuando vi esse filme, ainda morava aí no teu país, lembro bem que fiquei umas duas semanas a pensar no filme, é perturbador realmente, um grande filme.
Te agradeço por trazer esta lembraça e tb te agradeço pela visita lá na Lírica :).
bjinho
Gi
Belo espaço...
ResponderEliminarRetornarei com mais calma!
Hum, Despertar????
ResponderEliminarBeijo amigo!
Laura
Perturbador, sim, Gi. O Pollanski dizia que o verdadeiro cinema tinha de inquietar, não apenas divertir.
ResponderEliminarTenho passado no teu lírica, espaço onde o bom gosto e a sensibilidade dão as mãos.
Beijinho!
Obrigado pela visita e pela simpatia. Juan.
Um abraço!
Crónica d'O Despertar apenas circunstancialmente, Amiga Laura. O texto resulta mais da vontade de escrever sobre um filme que me marcou, mas, ainda assim, e caso não surja nenhuma crónica para a secção "Os Filmes da Minha Vida", esta será a que por lá irá figurar.
ResponderEliminarBeijinho grande!
P.S. Há um aniversário de alguém que me é muito querido que está aí à porta :)
Quem será???
ResponderEliminarBeijos!
Crash é um ótimo filme. Explora bem as interrelações a que estamos submetidos de forma imperiosa, independente da nossa opção. Abraço.
ResponderEliminarJorge, descobri um blogue com desenhos das ruas de Braga, ó espreita lá...
ResponderEliminarhttp://diario-grafico.blogspot.com/
achei o blogue lindíssimo!
Ótima resenha, Jorge. Esse filme é incrível e é preciso ver mais de uma vez pra poder absorver todos os detalhes. O retrato que ele faz das relações humanas é muito justo. A alternância dos papéis que representamos na vida depende sempre da situação a que somos submetidos, não é? É mesmo um excelente filme.
ResponderEliminarObrigada pelo carinho com as minhas letras. Fiquei honradíssima pela sua escolha, e curiosíssima para saber qual texto escolheu para a aula. rs
Beijo, querido
É verdade, Assis, é mesmo essa a minha leitura: a humanização dos caracteres torna o filme, mais que uma imitação da vida, a própria vida.
ResponderEliminarAbraço!
Sabes, Sylvia, vi o filme em 2004 e já na altura gostei muito. Por acidente, revi-o há oito dias e não imaginei que me tocasse tão profundamente como o fez (nem aquando da primeira vez que o vi). Acabei por, no dia seguinte, o ver de novo, e pela terceira vez (acho que chega, hehe).
O texto que escolhi para afixar num enorme plátano da escola é "Concomitantes". Um relato poético do real (um pouco ao jeito de "Crash").
Beijinho!
Acabo de passar por lá, Andy! Ainda que na diagonal, não deixo de notar o que havias sugerido: muito bom-gosto e uma capacidade de captar o real e filtrá-lo pelas impressões invulgar. Está lá a cidade, não como é vista por mim, por ti ou por outro turista qualquer; é a cidade que o olhar individual é capaz de captar.
ResponderEliminarA Velha-a-Branca é já uma instituição da cidade :)
Beijinho e obrigado por este presente!
Um filme singelo, mas significativo pela abordagem excepcional e intrincada em valores morais, pautado em racismo e reflexão sobre condutas.
ResponderEliminarfale mais sobre cinema ou crie um blog sobre esses assuntos!
abraço