as mãos dormitam nos bolsos embalando os olhos que incham sob a ameaça de revólveres azuis com aroma a alfazema. pelo sangue, travestis enrolam o sexo e mordem a carne que, espasmo após espasmo, entumece, galga os ossos, arranha a pele e reinventa o silêncio.
ao seu redor, pressente vozes sem boca e ecos sem memória. está só. ele e o gato vadio que esgravata o lixo. depois é o pátio, um insecto ruidoso e o automóvel que chia a alta velocidade. tudo passa… todos fogem… apenas ele permanece e de novo só. outra vez o jogo do silêncio…
nem a noite morna ou a beata esquecida nos lábios lhe estendem a mão e o olhar. só… como o mais vadio dos cães ou dos gatos que embriagam a lucidez dos homens.
boceja… inclina-se sobre o colchão do silêncio. os lençóis são o passado, cada vez mais sujo, cada vez mais roto. adormece no trilho da memória. a esperança há já muito que lhe dinamitou o peito.
cat power, i found a reason
ao seu redor, pressente vozes sem boca e ecos sem memória. está só. ele e o gato vadio que esgravata o lixo. depois é o pátio, um insecto ruidoso e o automóvel que chia a alta velocidade. tudo passa… todos fogem… apenas ele permanece e de novo só. outra vez o jogo do silêncio…
nem a noite morna ou a beata esquecida nos lábios lhe estendem a mão e o olhar. só… como o mais vadio dos cães ou dos gatos que embriagam a lucidez dos homens.
boceja… inclina-se sobre o colchão do silêncio. os lençóis são o passado, cada vez mais sujo, cada vez mais roto. adormece no trilho da memória. a esperança há já muito que lhe dinamitou o peito.
cat power, i found a reason
Meu Deus, amigo!... Dessa vez você foi fundo e conseguiu descrever (penso eu), a mais solitária das solidões...
ResponderEliminarQuando até a esperança já nos abandonou, o que mais nos resta?
Talvez "adormecer no trilho da memória, coberto com lençóis do passado", e nunca mais acordar...
Belíssimo! Quando penso que você não vai conseguir se superar você consegue.
Parabéns aqui soa pequeno.
Cid@
Ai, Jorge, fiquei triste. Tocou-me. E isso que importa. A tristeza se vai, fica a admiração por tuas palavras.
ResponderEliminarbjs.
Já sabes que não vou comentar!
ResponderEliminarObrigada!
Beijo
Laura
ana, só nos toca aquilo que deixamos tocar-nos. fico imensamente feliz por termos conseguido esse efeito através das sempre presentes palavras.
ResponderEliminarum abraço-sorriso, pois nem só de tristeza vive a poesia e o seu coração!
ufa... qualquer comentário às tuas palavras é mínimo, cid@... sabes que escrevi este texto há uns quinze dias e, daí para cá, venho protelando a sua publicação por não estar seguro de que o seu teor se inscrevesse totalmente na linha do que venho escrevendo. além do mais, receava que a minha mãe lesse o texto e achasse que estou a precisar de uma qualquer terapia de choque, hihihi!
ResponderEliminarobrigado por seres tão gentil, cid@! um beijinho!
já sabes que nem precisas de comentar, amiga laurita! um beijo!
ResponderEliminarMuito bom, Jorge. Meu olhar ficou preso à tela alguns segundos após a leitura. Parabéns, rapaz.
ResponderEliminarAbraço.
Jorge, isto lembrou-me Gisberta. O cidadão Brasileiro nascido Gilberto, em S.Paulo e que escolheu Portugal para viver. Personagem controversa que foi página de revistas e televisivas nacionais. Um transsexual com um rosto lindíssimo antes de cair em desgraça. Acabou morto por 13 adolescentes, quando era apenas um mendigo e já esquecido no rasto da humanidade.
ResponderEliminarAbrunhosa dedicou-lhe uma letra e música, ''a balada de gisberta''... ''como não'' te importas, vou colocar aqui!! Mas antes apenas digo, Portugal é um povo que cospe nos diferentes, quer eles sejam génios ou deficientes... e apenas quando morrem, fazem um choramingueiro, e enaltecem ou escarram no morto. Um povo que adora o circo, vocacionado para o circo e assim, não cumprem o destino maior ou o potencial de ser português.
Balada de Gisberta
Perdi-me do nome,
Hoje podes chamar-me de tua,
Dancei em palácios,
Hoje danço na rua.
Vesti-me de sonhos,
Hoje visto as bermas da estrada,
De que serve voltar
Quando se volta p’ró nada.
Eu não sei se um Anjo me chama,
Eu não sei dos mil homens na cama
E o céu não pode esperar.
Eu não sei se a noite me leva,
Eu não ouço o meu grito na treva,
E o fim vem-me buscar.
Sambei na avenida,
No escuro fui porta-estandarte,
Apagaram-se as luzes,
É o futuro que parte.
Escrevi o desejo,
Corações que já esqueci,
Com sedas matei
E com ferros morri.
Eu não sei se um Anjo me chama,
Eu não sei dos mil homens na cama
E o céu não pode esperar.
Eu não sei se a noite me leva,
Eu não ouço o meu grito na treva,
E o fim vem-me buscar.
Trouxe pouco,
Levo menos,
E a distância até ao fundo é tão pequena,
No fundo, é tão pequena,
A queda.
E o amor é tão longe,
O amor é tão longe… (…)
E a dor é tão perto.
ABRAÇO....
A Verdade é algo INSANA. Tudo é espelho de realidades bem maiores...
ResponderEliminarSerão as Trevas, Inferno e Escuridão a mesma coisa??
Um Abraço
ps. a fotografia é um espectáculo... uma conotação sexual e de morte...
lara, agradeço as palavras num texto que eu próprio hesitei em postar...
ResponderEliminarum beijo!
recordo-me perfeitamente do caso, nãosoueuéaoutra. todo o país o acompanhou e, se não de modo apaixonado, garantidamente não de modo indiferente. não sei se portugal e os portugueses é/são um país/povo que cuspa na diferença. definitivamente, portugal é um país com uma tradição muito enraizada onde as mentalidades estendem os braços a ritos e mitos que não se mudam de um dia para o outro. mas, aos poucos, algumas coisas vão mudando, e as minorias são, hoje, mais respeitadas, até do ponto de vista legislativo (ex.: casamento entre pessoas do mesmo sexo, lei da emigração...).
ResponderEliminaragora, energúmenos há-os em todo o lado. aqui e na volta do mundo, como bem sabes.
agradeço-te as reflexões que sempre acrescentam tanto a este nosso espaço.
um beijo!
Caraca Jorge...
ResponderEliminarpor instantes pensem em vários momentos vazios da minha vida... a tristeza e solidão são inevitáveis.
Belo texto
Bjss e parabéns pela colocação eximia das palavras
Pungente, em altíssimo grau. De ficar se chocando contra as muradas do crânio!
ResponderEliminarGrande abraço!
thabata, não há vida, por mais completa que seja, sem tristeza ou solidão. de resto, a existência destas torna todos os outros momentos mais valiosos. manic street preachers têm, no refrão de uma música, a frase "i'm happy being sad". curioso... contraditório... talvez verdadeiro.
ResponderEliminarum beijo!
marcantonio, há dias em que os dedos sobre o teclado parecem soltar a tinta de sal para escrevemos páginas como esta... parece ganhar vida própria, a escrita, e arrastar-nos para os seus desmandos... tu bem o sabes, verdade?
ResponderEliminarum abraço!
Lancinante: eis a palavra! E um texto desse, Jorge, precisa mostrar a cara ao mundo, era preciso que viesse, há coisas inevitáveis, palavras que precisam ser ditas. Lancinante - é o que digo!
ResponderEliminarAbraços,
Tânia
querido jorge, de uma beleza doída que calou-me.
ResponderEliminarfico com a imagem dos "olhos que incham sob a ameaça de revólveres azuis". Até a solidão tu descreves com imagens de uma beleza poética sem igual.
beijinho, amigo poeta!
a esperança fez estrago e explosão, a dor diária dinamita todas as perspectivas,
ResponderEliminarabração poeta,
éh ...
ResponderEliminarSão as mutilações das lembranças.
**;
e mais uma vez:
meus parabéns por escrever TÃO BEM assim !
Querido Jorge
ResponderEliminarEste seu texto reinventou o silêncio em mim: um grande silêncio para reflexão. Trata-se de escrito para muitas leituras. É ler, ler e ler... E querer ler outra e outra vez...
Parabéns, amigo!!!
Beijos
palavras que têm de ser ditas... com os lábios do silêncio amarrados às bocas da decepção...
ResponderEliminarum beijinho, tânia!
andrea, são seguramente piores que os de pólvora, estes revólveres azuis, que disparam as teias da noite e para as quais nenhuma aranha se consegue inteiramente preparar... ainda assim, sei de um mundo onde os revólveres são flores e o azul apenas uma das cores do arco-íris. quero acreditar que esta imagem não tenha sido apenas miragem sobre saharas de ilusão...
ResponderEliminarum beijinho, amiga poeta!
e agora... que rebentem as palavras, que se tornam tão espúrias quanto desnecessárias. a redenção surgirá a meio da tarde, debaixo do plátano de braços erguidos, no cano de aço com que a natureza molda as mais frágeis flores...
ResponderEliminarum abraço, sempre inspirado e inspirador assis, o poeta!
verdade sara:
ResponderEliminarlembranças mutildas...
lembranças que mutilam...
lembranças...
mutilações...
um beijinho!
zélia, sempre tão gentil nas tuas abordagens. agradeço-te, desejando um deus fauve a domar este silêncio azul e reinventando as cores no tecido dos homens...
ResponderEliminarum beijo, doce amiga!
Fulminante!
ResponderEliminarO lirismo que explode das tuas veias
penetra nos peito, nos poros, nos olhos
das faces alheias.
(A todo vapor...)
Beijos, precioso.
É impressionante a capacidade de cicatrização de um coração. Esquenta não. Passa.
ResponderEliminarBeijinho também ajuda a sarar qualquer dodói.
: )
querida amiga cris(tal),
ResponderEliminarsempre generosa nas palavras... agradeço-te todos estes carinhos verbais.
um beijo!
é impressionante a capacidade de cicatrização de um coração... bem o dizes, mulher na polícia, todavia, como o rosto perde a sua graça se marcado pelas linhas da mágoa, também o coração sofrido perde a espontaneidade nos afectos; torna-se frio, duro e receoso... até dos beijos de que falas...
ResponderEliminargrato pela tua visita! um abraço!
ainda vou a tempo amigo? a "dinamite" que tantas vezes não se consegue expressar e tu fizeste-o com tamanha beleza!
ResponderEliminarCat Power, adoro!!!
Beijinho
querida amiga andy, teria de ser o som calmo (embora nostálgico e muito melancólico) de cat power para contrastar com o caos das palavras... :)
ResponderEliminarum beijinho e sê sempre bem-vinda! sabe-lo bem!
Amigo, afinal passados uns dias voltei, voltei para comentar, ou melhor para acresecentar.
ResponderEliminarReconheço muito bem essa DINAMITE, já a senti e sinto em mim, bomba-relógio pronta a explodir se é que já não terá explodido.
Não desisti, não desitas!
Acabo por me colocar no mesmo patamar que tu, apesar de não o achar. Somos poetas, sofremos com isso, mas vivemos para isso, somos assim, Verdadeiros!
Hasta siempre!
Beijos
Jorge Pimenta,
ResponderEliminarPerturbador, nostálgico e, intenso.
Um estado de alma desnudado por uma solidão perversa que traja agudamente refém o lado esquerdo do peito de quem em cativeiro se retém.
Um final de dia reverso ao sentimento dolorosamente expresso no seu texto.
Ana
Senti na pele a dor..
ResponderEliminarda essêmcia de suas palavras..
Bjs
Insana
é de explosão em explosão, laura amiga, que o (nosso) mundo se reconstrói. pobre daquele que o deixa morrer nas linhas direitas do tédio...
ResponderEliminarum abraço!
ana, depois de ler o que escreves, convenço-me, sem reservas, da justeza do nome com que assinas: aquela que baila nas palavras (suas e alheias).
ResponderEliminarobrigado!
um beijinho!
da pele para as palavras de quem escreve e destas para a pele de quem lê, num ciclo interminável que apenas a poesia torna possível.
ResponderEliminarum beijinho, insana!
Belo e sério. É bom quanto a poesia pode mudar mentes. Cat Power de acompanhamento só engrandece a intenção.
ResponderEliminarBeijo querido.
obrigado, kenia! palavras gratas, as tuas, que guardo com um carinho imenso!
ResponderEliminarum beijo!
Ainda não tinha te escutado em prosa, Jorge. E como são fortes as tuas imagens, e como é fluído o teu texto, me levando adiante nessa solidão dinamitada. Gosto, gosto muito. E quero mais desses.
ResponderEliminarBeijo grande, querido