domingo, 21 de fevereiro de 2010

Porto de(s)abrigo (ou o diálogo silencioso)


- Por que não soltas a âncora, apontas ao horizonte e zarpas por oceanos sem bússola, ó marinheiro?
-Quisera eu, pelicano de manchas fulvas, mas esqueci o remo e a vela…
- Por que não alças as asas sobre as varandas do mundo para seres continuamente outro, ó capitão sem leme?
- Quisera eu, albatroz de voz redonda, mas a cera da coragem derreteu nos raios da inércia…
- Por que não te deitas sobre o corpo de água e fecundas portos-por-descobrir (lá onde apenas marinheiros sabem contar as histórias que nos moldam gente e entoar as melodias com que se constroem os dias), ó marujo sem estrelas?
- Quisera eu, gaivota sem costa, mas encostei o ouvido ao mar e naufraguei no seu silêncio…
- Por que permaneces quieto, atolado num cais sem corrente, com o vento por inaugurar, ó Neptuno sem trono?
- Porque a jornada se há-de cumprir num mar que não é teu nem dos homens; corre dentro de mim e um dia hei-de marejá-lo em nau de papel e mastro de tinta. Dos círculos da viagem nascerão rosas fecundando luas brancas e extinguindo abismos negros, como luz nos contornos líquidos do teu nome.

8 comentários:

  1. Cativante este diálogo. E eu cativo das palavras a ecoar. Abraço.

    ResponderEliminar
  2. Belíssimo diálogo...

    o teu blog está cheio de luz...faz-me lembrar um lindo farol :))

    ResponderEliminar
  3. Obrigado, querida Amiga! Por vezes o dia ilude-nos, deixando vazar algumas miríades de silêncio que se confundem com a luz... Já o farol... é mesmo uma miragem.

    ResponderEliminar
  4. temos amigos em comum. de vez em quando faço visitas de passarinho a esse seu ninho.
    hoje deixo um abraço.
    admiração do
    roberto.

    ResponderEliminar
  5. Obrigado pela viagem, Roberto.
    Já espreitei e me deliciei com o teu esconso, também :-).
    Um abraço!

    ResponderEliminar
  6. Jorge,
    Amigos em comum é paraíso e maravilhas!
    Por dizer do mar:
    "O mar com fim será grego ou romano,
    O mar sem fim é português."
    Linda Mensagem, sim!

    Abraço mineiro,
    Pedro Ramúcio.

    ResponderEliminar
  7. Ah, querido amigo, parece que andamos perdidos (encontrados) entre dialogos e vamos navegando nesse mar de papeis brancos e tinta!
    Beijos
    Laura

    ResponderEliminar
  8. Amigo Jorge, sem dúvida um de seus mais belos textos... Lí, relí, e a mesma sensação me tomou o espírito...

    "- Porque a jornada se há-de cumprir num mar que não é teu nem dos homens; corre dentro de mim e um dia hei-de marejá-lo em nau de papel e mastro de tinta."

    Sabê-lo caro marinheiro que:
    O importante é partir não é chegar...
    Pois que a âncora desta viagem a muito foi issada e a rota dos oceanos sem bússola outrora já foi traçada nas estrelas...

    Márcia

    ResponderEliminar