a noite era de outubro; a banda, os tindersticks. não sei porquê, mas antes mesmo de comprar os bilhetes imaginei um ambiente outonal, com folhas de cores dissipadas a aveludar a voz sussurrada e rouca de barítono de um stuart staples prenunciando a melancolia que percorre esta estação do ano e as canções da inesquecível banda de nottingham. não me enganei. nem mesmo a temperatura amena e a claridade que emoldurava os céus do porto conseguiram iludir a sonoridade que sempre marca os acordes da banda, caracterizados, justamente, pela simplicidade triste e melancólica, potenciada por uma voz que segue a melhor tradição de trovadores que (en)cantaram uma geração, como é o caso de leonard cohen.
o palco foi um dos mais emblemáticos do país: o coliseu. casa cheia (o que não estranha, tal é a força dos tindersticks junto do público português que, desde 1993 – o ano da sua formação –, sempre lhes devotaram veneração); a heterogeneidade do público apenas a suspeita de que não há uma idade ou um tempo para se gostar de escutar boa música. no palco, exibe-se a parafrenália instrumental a que a banda recorre com o propósito de renovar o seu som, num exercício que, se dúvidas houvesse, reputa os seus elementos como músicos verdadeiros e não apenas rapazes que vendem canções.
nunca assistira a qualquer concerto dos tindersticks antes, mas confesso que figuravam no elenco daqueles que teria de garantir, mais cedo ou mais tarde. E a razão é apenas uma: vivi ao som de faixas como can we start again ou my oblivion, sempre bordadas pelo fino recorte da voz do seu imortal vocalista.
o espectáculo começou à hora marcada (ou não fosse a banda natural da old albion), sem grande aparato ou alarido. os sete músicos invadiram o palco e por ali permaneceram durante cerca de hora e meia, focando a sua atenção em temas do último álbum, falling down a mountain, mas não ignorando clássicos intemporais, como buried bones, here ou tiny tears, este já num muito aguardado encore.
a actuação foi sóbria, elegante, muito performativa e quase nada espectacular, bem secundada por uma variedade de efeitos de luz que, em momento algum, se revelaram ostensivos ou distractivos. e nem mais seria necessário, pois o intimismo da voz e das canções, a beleza das letras, bem assim como o ambiente encantatório que os tímidos movimentos de staples e sua banda esboçavam em palco, garantiam um quadro de delicadeza e ternura que embalou para momentos de desprendimento material. os mais desatentos, os menos conhecedores dos ritmos dos tindersticks ou os pápa-concertos desabridos podem alegar que a actuação chegou a roçar a frieza (os inevitáveis piropos pontuando o final de cada canção oscilavam entre o marvellous e o és uma salgadeira!). a verdade é que a beleza não tem de ser explicada: é, ou não é; sente-se, ou não se sente. tudo o mais é fait-divers; tudo o mais é acessório.
lá fora, já no carro, o concerto continuava, ainda com staples e os tindersticks. naquela noite amena de outono, o regresso fez-se depressa de mais…
tindersticks, buried bones
tindersticks, my oblivion
o palco foi um dos mais emblemáticos do país: o coliseu. casa cheia (o que não estranha, tal é a força dos tindersticks junto do público português que, desde 1993 – o ano da sua formação –, sempre lhes devotaram veneração); a heterogeneidade do público apenas a suspeita de que não há uma idade ou um tempo para se gostar de escutar boa música. no palco, exibe-se a parafrenália instrumental a que a banda recorre com o propósito de renovar o seu som, num exercício que, se dúvidas houvesse, reputa os seus elementos como músicos verdadeiros e não apenas rapazes que vendem canções.
nunca assistira a qualquer concerto dos tindersticks antes, mas confesso que figuravam no elenco daqueles que teria de garantir, mais cedo ou mais tarde. E a razão é apenas uma: vivi ao som de faixas como can we start again ou my oblivion, sempre bordadas pelo fino recorte da voz do seu imortal vocalista.
o espectáculo começou à hora marcada (ou não fosse a banda natural da old albion), sem grande aparato ou alarido. os sete músicos invadiram o palco e por ali permaneceram durante cerca de hora e meia, focando a sua atenção em temas do último álbum, falling down a mountain, mas não ignorando clássicos intemporais, como buried bones, here ou tiny tears, este já num muito aguardado encore.
a actuação foi sóbria, elegante, muito performativa e quase nada espectacular, bem secundada por uma variedade de efeitos de luz que, em momento algum, se revelaram ostensivos ou distractivos. e nem mais seria necessário, pois o intimismo da voz e das canções, a beleza das letras, bem assim como o ambiente encantatório que os tímidos movimentos de staples e sua banda esboçavam em palco, garantiam um quadro de delicadeza e ternura que embalou para momentos de desprendimento material. os mais desatentos, os menos conhecedores dos ritmos dos tindersticks ou os pápa-concertos desabridos podem alegar que a actuação chegou a roçar a frieza (os inevitáveis piropos pontuando o final de cada canção oscilavam entre o marvellous e o és uma salgadeira!). a verdade é que a beleza não tem de ser explicada: é, ou não é; sente-se, ou não se sente. tudo o mais é fait-divers; tudo o mais é acessório.
lá fora, já no carro, o concerto continuava, ainda com staples e os tindersticks. naquela noite amena de outono, o regresso fez-se depressa de mais…
tindersticks, buried bones
tindersticks, my oblivion
... and she smiles.
ResponderEliminarLindo, lindo, lindo!!!
Eu não conhecia. Obrigada por compartilhar.
Beijinhos.
Poxa, que bacana! Gosto muito deles, gostaria de ir ao um show tbm.
ResponderEliminarBeijo!
pólen,
ResponderEliminartindersticks é o complemento perfeito a um bom vinho, poesia e alguém que os saiba degustar.
um beijinho!
larinha,
ResponderEliminarhá uma relação muito especial entre os tindersticks e o públio português. já ca vieram por diversas ocasiões e cada concerto é um espectáculo renovado. daí casa cheia em ambientes intimistas e humanizados. adorei!
um beijinho!
Jorge,
ResponderEliminarPois fiquei com todo o gosto a aguardar-te... :) e que bela surpresa... assisti ao teu concerto e nem precisei de bilhete! :)
Senti a noite
Até os ossos estremecerem
A voz da banda
É dança de folhas aveludadas
sopradas em tom melancólico
Que se perde
Na moldura do azul
Este bordado musical
Não envelhece no tempo
E ouvi-lo
Nunca será
(Tarde) de mais
Dizias "para variar, os próximos posts não serão poesia: proponho música..."
... não será poesia a música assim despida, resvalando até (ao mais profundo de) nós em pura arte melódica?
Gosto imenso da "buried bones" e esta banda é realmente uma beleza!
Beijinhos!
jb,
ResponderEliminaraprendemos nos bancos da escola que a poesia, pelos seus artifícios rítmicos e melódico-expressivos, é, também, música. as boas músicas têm, igualmente, boas letras. se juntarmos uma boa melodia, uma boa letra e uma performance como a descrita (por mim, no post, mas sobretudo por ti, no comentário - a propósito, tens a certeza de que não estiveste lá? :)), então temos poesia do mais fino veludo. é o caso, sem dúvida.
entretanto, já arranjei bilhetinhos mágicos para the national. é só em maio, mas não posso correr o risco de os perder :)
um beijinho!
...você deveria ser crítico de arte,
ResponderEliminarpois 'desenhas' como ninguém tudo que
é bom, que faz bem aos olhos, aos
ouvidos, e o melhor, aos sentidos!
bj, alma linda!
vivian,
ResponderEliminaré tão fácil; basta deixarmo-nos seduzir pelo que é belo, verdade? :)
um beijinho com ternura!
Oi Jorge!
ResponderEliminarQue delícia compartilhar conosco esse magnífico concerto dos tindersticks que vim conhecer aqui com sua agradável apresentação, quer dizer... eu assisti o "Fabuloso Destino de Amelie Poulain", mas não lembrava.
Um beijo!!
senti-me dentro do show e continuo ouvindo as canções,
ResponderEliminarabração
que maravilhosa descrição, amigo!
ResponderEliminarconfesso que não os conhecia, mas do que ouvi e vi aqui gostei muito, vou procurar mais.
P.S. até o título do post está lindo :-)
Beijinho!
o fabuloso destino de amélie merecia uma música fabulosa como essa, verdade, lívia? :)
ResponderEliminarum beijinho!
assis,
ResponderEliminardentro do show... e sem bilhete, hehe :)
é, na verdade, uma banda com muito substrato, esta.
um forte abraço, poeta!
doce amiga andy,
ResponderEliminartindersticks é daquelas bandas que passam despercebidas, por não terem um registo de massas. mas acredita, cada cd vale bem o que custa. e o concerto, então, nem se fala. este ano não se espera que regressem, mas no próximo tê-lo-emos no porto e em lisboa, de novo.
um beijinho!
gente que delícia de música
ResponderEliminare que descrição do show... eu me senti parte dele junto com vc
adorei a descoberta musical que me proporcionou.
obrigada por isso.
beijos
enorme poetisa,
ResponderEliminarse não conhecias tindersticks e, por este post, passaste a conhecer, então já valeu a pena tê-lo escrito. irresistível a sua música, verdade?
um beijinho!
Jorge, meu doce e querido poeta,
ResponderEliminarQue delícia vê-lo nesse texto, onde descubro mais um talento seu, o de um escritor cuidadoso em detalhes, que só com muita sensibilidade se consegue. Mais que um comentário, aqui há, um relato de paixão.
Como compositora e por ter vivido mt tempo nesse mundo de sonoridades diversas, eu tenho um amor especial pela música e não poderia deixar de me comover com esse seu encontro, pq eles são, verdadeiramente, uns encantados.
Bjs, dessa amiga que te estima
E que melhor maneira de se passar uma noite, se não em companhia de tão boa música???...já tive a oportunidade de os ver e ouvir ao vivo no Coliseu do Porto e essa noite guardo-a também naquele cantinho especial onde alojo todas as memórias que em mim se refectem...não admira que desse origem a tão inspirado texto..
ResponderEliminarUm beijo
Excelente banda! E o primeiro vídeo, eu ameii...É meu filme favorito, "Le fabuleux destin d'Amélie Poulain" este filme é simplesmente encantador!
ResponderEliminarBeijinhos
querida ira,
ResponderEliminarpois se não era de esperar, numa alma tão preenchida dos encantos da poesia, que outras artes remexessem, também. a música, o canto de orpheu, as sereias encantadas, o flautista de hamelin e outros tantos que põem nas mãos dos deuses (e por que não dos homens) a difícil tarefa de escolher qual delas a mais arrebatadora (por que não ambas?).
um beijinho com ternura na voz, artesã de artes mil!
poeta-espelho,
ResponderEliminarnão imagino o que sentiste nessa noite memorável; sei-o bem :)
um beijinho!
maria,
ResponderEliminar"amelie" figura, também, entre os que mais me marcaram. teria dificuldade de escolher entre "o clube dos poetas mortos", "mediterrâneo", o "carteiro de pablo neruda", "as pontes de maddison county" ou este "fabuloso destino de amelie". como os bons filmes merecem as melhores melodias, amelie bate às portas do céu!
um beijinho!
estou de volta meu caro...
ResponderEliminarabraço
Jorge. Agradável retornar ao seu degustativo e irresistível espaço, lugar de intimidade letral, e saborear tão belo relato, que me deixa enamorada. Realmente, 'a verdade é que a beleza não tem de ser explicada: é, ou não é; sente-se, ou não se sente'. E com isso, cada vez mais, ir ao encontro do íntimo, e de dentro brotar um manancial.
ResponderEliminarAbraços
Priscila Cáliga
Não posso avaliar a letra, mas a música é envolvente. Não conhecia, mas meu coração sentiu saudade de algo que não pode ser identificado,de algo bom, talvez do não vivido...Grata pela oportunidade de conhecer algo novo e belo.
ResponderEliminarcaro juan,
ResponderEliminarexcelente nova. sê bem regressado a um espaço que é teu, desde o início das publicações. fico profundamente feliz por isso.
um abraço!
priscila,
ResponderEliminara ideia de beleza conjugada com o genericamente entendido como trivial, irrelevante ou mínimo é a matriz para a definição verdadeira do conceito: o individual, pessoal e até íntimo sobrepõe-se ao comum. por isso ela é, ou não é; sente-se, ou não se sente. é este o arquétipo maior.
que bom rever-te por aqui!
um beijo!
rita,
ResponderEliminara tua descrição recupera a ideia que caracteriza as melodias de tindersticks: a saudade, a nostalgia de algo que se já não tem (ou que apenas exisitu na falácia da ilusão). presentemente encontro-me nessa fase: a de questionar se aquilo de que sinto saudade alguma vez existiu...
um beijo!