ian saudek
I. colheita
os copos estão vazios
embriagados no álcool da viagem.
II. profana comédia
o riso dos homens
salta das janelas da noite
como borboletas em chamas.
o fogo beija-lhe a pele
incendiando bocas e línguas
em latifúndios de prazer.
por que é que só sei sorrir?
III. ítaca
da terra sobe um hálito floral
que toca os abismos do oceano:
marés de sangue atolando a cabeça
correntes de fel estacando o peito
ventos húmidos arrepiando o sexo.
entre sereias e penélopes
uma só certeza:
ulisses vive.
IV. pomares
somos o tempo
(diz borges).
qual é, então, a idade do coração?
(pergunto-me).
talvez a dos frutos sem sombra.
radiohead, street spirit (fade out)
sexta-feira, 8 de outubro de 2010
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Jorge, querido! Sua poesia é fantástica!
ResponderEliminarVc se expressa de forma tão latente, tão lúcida e tão marcante que fica difícil comentar seus versos... rs
Só posso dizer, de todo o meu coração, que admiro demais a forma como escreve. Parabéns, grande Poeta!
Beijos
coleccionadora de silêncios,
ResponderEliminarobrigado pelas palavras sempre tão carinhosas. esta, como qualquer escrita, só faz sentido se for capaz de estender os dedos e tocar alguém do lado de fora da tinta. ainda bem que estás aí.
um beijo!
“ embriagados no álcool da viagem
ResponderEliminarcomo borboletas em chamas
correntes de fel estacando o peito
qual é, então, a idade do coração? ”
Não resisti, a fusão é por admiração...
Sinceramente, tu és genial!
Beijos, estimadíssimo.
cris, amiga e companheira de versos, vejo que estás em excelente forma :); a reescrita é sempre um exercício de complexidade imensa; ergoa taça e dedico-te o brinde. daqui a nada sai mais um a duas mãos, certo? :).
ResponderEliminarum abraço!
Jorge,
ResponderEliminarPerco-me nas viagens das tuas etiquetas...
E como gosto de andar à deriva, fui colhendo (no pomar da tua poesia:) um fruto aqui outro acolá... e viajei assim:
Os copos transbordam o néctar dos frutos criados no coração (sem idade) onde Ulisses e penélope saborearam o melhor sangue que corre nos oceanos dos que desafiam a pior tempestade e a vencem, com delicadeza e bravura, nas asas de borboleta que salpicam os céus em movimento sorridente, rasgando o azul que só cora no vermelho desse beijo, fogo na alma dos que semeiam pomares de deliciosa e suculenta poesia!
Mais uma vez, os meus sinceros parabéns!
Beijinho
jb,
ResponderEliminaras etiquetas caem-me das mãos e pousam sobre a escrita com discricionariedade. com os teus dedos, entrelaçam-se num fio de urdidura fina que os conjuga numa nova tecitura, convidando à releitura de novos sentidos.
devolvo-te as felicitações!
um beijo!
"...aqueles que mais entendem de felicidade são as borboletas e as bolhas de sabão e tudo que entre os homens se lhes assemelhem" (Nietzsche)
ResponderEliminarMas, por que as borboletas e as bolhas de sabão? Ora, a beleza da vida está na fragilidade, na arte de pisar nas nuvens!
Amar é um abismo feliz, e sua linguagem nos encanta por sua expressiva compreensão do amor.
Um beijo!!
lívia,
ResponderEliminartemos as borboletas, as bolas de sabão, o éter, o vento... na sua leveza reside muito do que entendemos por felicidade, ou não fosse o infortúnio (em sentido contrário) o lastro insuportável dos dias. sempre oportunas as tuas referências.
a propósito de amar e de saber alguma coisa sobre o amor, hoje escutei dois versos de uma canção menor que registei mentalmente: "o amor é uma doença, quando pensávamos que era nele que residia a cura". curioso, não?
um beijinho!
Jorge, meu amigo, de onde vem tanta inspiração? Profana comédia: uma maravilha! Leio e releio-te sempre... Já és um meu poeta de cabeceira...:-)
ResponderEliminarGrande beijo,
Cada vez mais aderentes ao espírito as suas etiquetas, Jorge. Certeiras como as setas de Filoctetes (só para juntar ao seu Ulisses). Nesse sutil "pomares" um maravilhoso fruto sem sombra!
ResponderEliminarGrande abraço, Poeta!
tânia, amiga,
ResponderEliminare por falar de poetas e poesias... para quando o teu regresso às nossas mesas-de-cabeceira? :) aguardamos-te.
um beijo!
por mais mergulhadas que estejam na bílis venenosa, aquilo que as flechas de filoctetes sabem incendear são as piras funerárias; o coração dos homens arde com o fruto sem sombra... porque é ele o próprio tempo.
ResponderEliminarum abraço, marcantónio!
tânia,
ResponderEliminaracabo de passar no teu roxo violeta e de saudar o "branco silêncio" do teu regresso. que bom!
um beijo renovado!
cheio de essência, amigo!
ResponderEliminardas borboletas em chamas, do fogo que beija a pele, o hálito florar da terra...
a idade do coração será o infinito saborear desses frutos.
Belíssimo.
Beijinho!
querida amiga andy,
ResponderEliminarapetece-me reescrever o texto. acho que o coração não tem idade; é como os poetas e a poesia: não sabe envelhecer!
um beijinho com imenso carinho!
bendita as palavras nesta profana (divina comédia humana)saga de encontrar caminhos para Ulisses nas trevas de um Borges iluminado. ouso a penelópe mais arredia ouvindo radiohead em doce orgia,
ResponderEliminarabraço poeta das viagens
Muito obrigado :)
ResponderEliminarMe prendi à sua última etiqueta, e me pergunto também: qual é, afinal, a idade do coração???
ResponderEliminarO meu, hoje, posso te garantir, está com menos de 3 anos (ou mais precisamente), a idade da neta, que está chegando prá passar o feriado em BH.
Posso te garantir também, que já existiram vezes, em que o percebi um ancião com mais de 100 anos...
Qual é então a idade do coração?
Penso que é a que mais condiz com o nosso estado atual.
Então, até mais, amigo.
A partir de agora, e até quarta feira, vou aproveitar meu coração infantil prá me deslumbrar com a vida.
Beijo afetuoso
Cid@
Lindíssimo, meu querido Jorge!
ResponderEliminarTudo magnífico!
"Pomares" aprisionou-me...
Grande abraço, amigo!
amigo assis,
ResponderEliminarquem de nós não tem ulisses e penélope aprisionados nas suas viagens (as feitas e as por emprteender)? é que, apesar de borges garantir o contrário, nem sempre somos senhores do tempo... haja, em cada um de nós, e apesar de todos os falhanços, o "espírito da estrada". sempre (radiohead).
um forte abraço!
paulo,
ResponderEliminarum abraço!
amig@ sempre bem aparecid@,
ResponderEliminarque estes dias o rejuvenesçam; entre as carícias e as gargalhadas das crianças, é impossível que não viceje. desfruta da tua pequena neta.
um beijinho!
obrigado, zélia querida.
ResponderEliminarsou capaz de entender por que te tenhas fixado de modo particular em "pomares"; é que, como o melhor dos frutos, as tuas palavras esbanjam doçura.
um beijinho!
Jorge...
ResponderEliminarHá dois dias leio estas "etiquetas"...
Porque as coisas parecem ter só o tempo certo da nossa urgência? O depois é um luxo que o coração parece não entender.
A idade do coração??? O meu é tão velho que parece estar sempre na iminência do último pulso. Ele nunca pode esperar por nada.
Sempre achei que Ítaca não era um destino, mas a única certeza que teimava em escapar de Ulisses (que sentia prazer em se perder).
A música é linda, querido.
E tu, com tua poesia, acendes a luz de lugares aqui dentro que eu não conhecia.
Beijos e cheiros...
nosso coração não tem idade, nós tambem nao, dentro da gente existe sempre aquele que sonha, que permanece atemporal.
ResponderEliminarbeijo!
Jorge, meu poeta querido,
ResponderEliminarAs etiquetas, todas, eu absorvo na pele, mas em especial colheita, pois me embriago nas viagens, muito das suas, mas quando o copo esvazia, eu que nunca sóbria volto a enchê-los do líquido vital.
Saudade de você.
Bjssssssss
querida pólen,
ResponderEliminarnão consigo deixar de pensar no que dizes: "por que será que as coisas têm apenas o tempo certo da nossa urgência?". borges estava certo, afinal: o tempo somos nós, com esta dupla fatalidade: quando estamos bem, voa; quando não nos serve, arrasta as suas pregas daninhas sobre as searas onde escondemos os nossos desejos, impondo-se ao arbítrio que julgamos deixar de nos pertencer. vã ilusão; sempre foi nosso, sempre nos pertenceu, mas porque o fruto nem sempre sabe esconder-se das sombras, cremos que deixe de nos caber no bolso das calças.
como compreendo a única verdade de ulisses... procurou domar o tempo viajando sobre a sua única certeza. não chegar é o tempo certo para eternizarmos a nossa busca. tal como penélope, afinal, ainda que viajando dentro de casa, através do novelo do sonho. e assim se viaja tendo a própria ida como horizonte derradeiro.
um beijinho com carinho imenso!
so sad,
ResponderEliminaressa intemporalidade de que falas é o que nos eterniza. o pior de tudo é quando sucumbimos às sombras que engavetam o coração num quadril de odor intenso a nafta... preservar, no altar da memória, a mágoa, a dor e o sofrimento passa a ser a única prioridade. e nesses preparos, o tempo deixa de nos pertencer.
mas, mesmo que racionalmente as lógicas possam funcionar assim, como contrariá-las?...
um beijinho!
ira, querida amiga e singular poeta,
ResponderEliminaras viagens são, em mim, o verdadeiro velo de ouro; não aquele que se desenha no final do arco-íris, fogo de santelmo sagrado onde marinheiros e ninfas se perdem no reencontro de vontades e sonhos, mas o que se desenha nas águas que são esventradas pela proa das barbatanas. até porque, e saramagando, "sempre caminhamos para onde nos esperam".
um beijinho enorme!
Idade do coração tem relação com quanta taquicardia ele já teve? Rs.
ResponderEliminarnão propriamente... a taquicardia é sobretudo um aferidor da idade do corpo :)
ResponderEliminarEstou a escrever este comentário
ResponderEliminar(que para mim sempre é saudar um grande poeta)
ouvindo radiohead: cantam os teus versos
(a minha alma assim traduz
ou imagina ou ambas as coisas) .
Alegro-me muito, meu amigo,
em tê-lo sempre como irmão de pena
(lucidez e desvarios) abraço-lhe a alma
com profunda amizade
e admiração.
Magníficos os versos.
O coração, menino eterno e guardador de todas as idades, permite a suavidade profunda dos teus versos esvoaçantes,onde, sempre que leio, sinto-me a dar continuidade dentro de mim. Grande abraço.
ResponderEliminarQuerido Jorge...
ResponderEliminarSua escrita me arrebate e me acalma... és um presente para o meu coração ferido e minha alma aflita nesse corpo inquieto...
Deixo meu beijo
Com muito carinho
Sil
Sempre aqui
...querido lindo,
ResponderEliminaro coração não tem rugas,
assim como a alma dos poetas
que, quanto mais velhos, mais
encantadores se nos apresentam
nas sutilezas das palavras.
um beijo, poeta de encantos!
Vc está longe, muito acima, bem perto dos deuses.
ResponderEliminarBeijo de admiração, poeta!
amigo domingos,
ResponderEliminarnum dia especialmente difícil para mim, agarro-me à amizade genuína que escorre das tuas palavras, sem dúvida que conforto infinito. entre poetas há sempre uma certa irmandade, não dessas secretas, a meio caminho entre as trevas e a redenção, mas daquelas que sentem as coisas com um coração simples: aquele que pulsa coma mesma cadência e que se exprime na mesma linguagem.
um forte abraço, com amizade e admiração!
rita,
ResponderEliminaré essa a magia da poesia. não sabe morrer. é por isso que cada leitura (e cada leitor) lhe acrescenta novos matizes; são os tons que cobrem o olhar. e ela renova-se ad eternum.
um beijinho!
silene,
ResponderEliminarnenhum poema canta o universo nas suas coordenadas geograficamente limpas; tudo é inquietação e dispersão. do encontro dos versos com corações com o mesmo quadro genético se faz a serenidade. por isso a poesia vive dentro de cada um de nós.
um beijinho!
vivian,
ResponderEliminartorga assevera que, nos poetas, " o coração / mesmo velho viceja" :)
um beijinho!
larinha,
ResponderEliminarpara quê querer estar junto dos deuses "onde o governo está da humana gente" (camões e "os lusíadas")?
o meu olimpo é aqui, onde a imperfeição dos homens é recompensa que deus nenhum ousará almejar.
um forte abraço!
Jorge
ResponderEliminarNem tudo alcanço dos teus versos, poeta.
Sei ler melhor com o coração, e ele sente que você está triste.
Ainda assim, egoísta, eu venho buscar alimento poético nesse pomar.
bj
Rossana
Ah, belas as tuas etiquetas!
ResponderEliminarseremos o que quisermos e não o que nos deixam ser
para frente, em frente!
Beijos
Laura
rossana,
ResponderEliminaros versos escrevi-os eu; o pomar já me não pertence.
como fico feliz por saber que o seu suco ainda é capaz de ajudar a saciar sedes...
um abraço!
amiga laura,
ResponderEliminartodos os diários são (im)possíveis :); mas tem presente que, apesar de podermos ser quem quisermos, "sempre caminhamos para onde nos esperam". nunca se desista da estrada (street spirit, radiohead).
um abraço!
Claro, mãos abertas na retaguarda. :)
ResponderEliminarBeijo, meu parceiro das liras!
Olá Jorge,
ResponderEliminarimagem de múltiplas interpretações
é bem verdade que, tanto as imagens e o som que você escolhe tornam a composição de uma integração com suas poesias/seus poemas, que é uma maravilha, de uma sensibilidade tocante.
Vi umidade, água, mar, rio, cachoeiras, molhadas etiquetas
um abraço
amiga cris,
ResponderEliminara mão aberta, sim; sempre. mas a olhar para diante. a poesia que remexe nos bolsos do morto e não deseja a vida acaba por, ela própria, finar-se.
um beijinho, amiga da voz certeira e encantada!
olá, vais,
ResponderEliminarsensíveis são sempre as tuas palavras bordadas em tecido de leitura fino e delicado.
um abraço!
Jorge, Ítaca é um primor, e radiohead foi um capítulo à parte enquanto eu lia.
ResponderEliminarE viajei b o n i t o nas asas desses versos.
beijos
Meu poeta!
ResponderEliminarEstou encantada com a poesia.
O que suas palavras dizem contém uma dose enorme de verdade, que chega até mim com um gole de bebida quente.
Tuas palavras escorreram pela minha garganta.
Vejo nelas o tempo e todas as questões da vida que trago comigo.
Mas o mais importante, sinto o poder das suas escolhas... E isso, já me bastou.
Beijo mágico!
Fabricante de Sonhos
Tempo e não-tempo se tecem dentro de nós - somos um pouco sereias, um pouco penélope, outro tanto Ulisses, e cada viagem nos embriaga.
ResponderEliminarBelos poemas, JOrge.
Um abraço amigo.
mai,
ResponderEliminarbem-vinda, de regresso, às viagens. tantas são as ítacas que se erguem sobre as águas que navegamos; nunca deixemos de ser ulisses.
um abraço!
fabricante de sonhos,
ResponderEliminaré nesta inquietude de questões tantas vezes sem resposta que fundamos o território a que chamamos "viagem", "casa", "felicidade". não te iludas, querida amiga: mesmo aquilo que parece resposta não é mais que o reverso da respectiva pergunta, em eco permanente.
um beijinho com ternura!
dade,
ResponderEliminarhá instante comentava isso mesmo com a mai; somos um tanto de ulisses, penélope, sereia, ítaca, mas muito mais vezes do que devíamos nenhum deles.
um beijinho!
http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=_UQmY57qrfw pra agitar depois da querida melancolia radioheadística.
ResponderEliminarQuanto a Borges: http://chegadessaudade.blogspot.com/2010/08/o-tempo.html