sábado, 13 de agosto de 2011

Festival Sudoeste 2011 – Interpol e The National [dia 07 de Agosto]


Tens menos de 30 anos, gostas de música discoteca e de beber até que a alma doa? Vem ao Festival Sudoeste!!!


Este poderia muito bem ser o slogan do festival de Verão mais conhecido do país, aquele que atrai quase 40.000 pessoas por dia ao imenso recinto da Herdade da Casa Branca, numa das zonas mais bonitas de Portugal: a Zambujeira do Mar.
Não precisei de conferir a minha data de nascimento no Bilhete de Identidade e muito menos de espreitar as faixas que guardo zelosamente no mp3 para ver [não a dobrar] e saber que estava deslocado do maléfico slogan que aqui engendrei.
Mas, o que me arrastou até lá, afinal? Loucura ou masoquismo? Nem uma coisa nem outra.
A verdade é que mesmo com tristes notícias de assaltos em tendas e histórias de violência e drogas, o SW tem algo de muito especial que me atrai desde há alguns anos (ainda que com presenças intermitentes): praia, pé no chinelo, calor, [alguma] boa música, um ambiente que no recinto é descontraído e muito simpático, mas, sobretudo, memórias [muitas, vividas e por viver] justamente tudo o que em cada um de nós permanece para lá da frágil materialidade.


Pode parecer estranho, mas, sem o saber, planeei esta viagem até à 15ª edição do SW em Paredes de Coura, no distante verão de 2008, quando, ao som de Sex Pistols, confidenciei aos camaradas de festival que a banda a que mais queria assistir ao vivo se chamava Interpol. Choque absoluto! Então, e Radiohead? E Pink Floyd? E U2? Por mais argumentativo que tenha sido, a verdade é que não fui capaz de vencer o cepticismo de todos e das minhas palavras certamente sobraram faíscas de provincianismo ou sandice musical.
A resposta encontro-a nas minhas mais fundas raízes musicais, quando, ainda menino, escutava Joy Division, banda do mítico Ian Curtis que compunha sobre a vida como ela é [ou nos parece], sempre num registo sombrio que explora as viagens emocionais do indivíduo, o caos e a ordem, a alienação, a degeneração urbana e demais sensações com que nos degladiamos no dia-a-dia, muito para lá do que o corpo e a mente sabem [podem] suportar.
E porquê Interpol? Porque nenhuma banda desde então, na esteira de Joy Division, foi capaz de me tocar tão intensamente os sentidos, e sobretudo a alma, como esta nova-iorquina.
Imaginá-los ao vivo foi uma verdadeira aventura sensorial, mesmo sabendo que o seu registo se enquadra mais num ambiente intimista, pessoal e fechado de uma qualquer sala de espectáculos do que num cenário de festival. Tê-los no Sudoeste era um risco que eles, eu e todos os que se deslocaram até à Zambujeira propositadamente para assistirem à sua actuação tinham de calcular.


O concerto, inicialmente aprazado para as 22h, começou com um atraso de 45 minutos. Talvez por isso, a que acresce o facto de esta ser a derradeira noite de festival e ainda de haver, a fechar o dia, uma banda com uma fórmula comercial de sucesso que arrasta milhares em qualquer contexto – Os Suedish House Mafia –, os espectadores estavam dispersos ou, se diante do palco, faziam-no com o único intuito de aguardar pelo seu momento musical. Consegui, por isso, arrastar-me com facilidade até à grade diante do palco onde, conjuntamente com uma mole apreciável de dilectos seguidores, pude seguir uma hora exacta de um concerto que, para a crítica, foi “frio, para não dizer decepcionante”. Nada mais enganosa esta apreciação, a provar que a crítica especializada avalia as performances por critérios como os gritos da assistência, as palhaçadas dos músicos em palco ou o número de improvisos nos alinhamentos musicais dos discos gravados. Essa não é a essência de Interpol e a verdade é que quem os conhece delirou com um concerto sério, assertivo, muito próximo das canções originais, sempre de recorte fino e delicado, a dar corpo à máxima “what you see is what you get”. Do alinhamento musical, o álbum Antics foi estrela com uma mão cheia de excelentes canções, bem acompanhadas de outras faixas conhecidas de um público devoto e irredutível. Frios e pouco expressivos? Talvez, mas não serão esses atributos marcas de identidade de uma banda que recusa os formatos que tão subitamente transformam astros em estrelas cadentes? De resto, vi Paul Banks sorrir e Kessler a deslizar pelo palco em souplesse enquanto desferia os acordes de Evil, Slow Hands, Heinrich Maneuver ou da inigualável Not Even Jail, o que é para mim indício de que tocavam com prazer para quem os soubesse escutar.


No final já não tinha voz. Mas ainda faltava The National…
Não sei se por se aproximar a hora mais aguardada da maioria dos festivaleiros, se por terem visto Matt Berninger actuar de copo de vinho na mão, a verdade é que o público apareceu em maior número no concerto de The National, tendo sido também mais participativo.
Mas, de novo, senti o concerto como perfeito no lugar errado. Com uma postura em palco mais interactiva e uma set list cuidada, combinando algumas faixas mais populares com outras que funcionaram como testes ao excelente último álbum [não tendo mesmo faltado melodias que convidam ao relaxamento do batimento cardíaco], os The National mostraram que são mais camaleónicos do que os Interpol. Todavia, que concerto pode resultar em absoluto se diante de um público que os conhece de nome, que aplaude nos hiatos de algumas faixas, que conversa para o lado, ou que clama pela banda que vai actuar no momento seguinte?



No encore (frouxamente clamado pelo público, como o próprio Matt fez notar ao microfone), o tom subiu ao som dos inevitáveis Mr. November e Terrible Love, tendo atingido a sua expressão maior quando o próprio vocalista desapareceu por entre a multidão, deixando os seguranças com os nervos em franja.
O Festival terminava aqui, para mim. Já eram quase 2h da manhã e os festivaleiros ávidos de decibéis descontrolados e luzes de discoteca acotovelavam-se para chegarem até junto do palco para o derradeiro concerto. Voltei as costas ao palco; o meu lugar bem lá à frente ficava para todos aqueles que não distinguem bolotas de pérolas.

interpol, slow hands

the national, sorrow

15 comentários:

  1. viajei até o festival, a música parecia tocar aqui fazendo eco no peito, teu olhar narrativo captou essências,


    abraço

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  2. Nossa, deve ter sido muito bom esse Festival. Não sei se sabem, mas, outro dia falando com meus pais sobre os nossos sonhos, confidenciei-o o meu: disse que para completar minha existência seria necessário que eu fosse a uma casa de fados aí em Portugal e ouvisse pelo menos um, na voz de alguma cantora fadista (prefiro às vozes femininas)... Então poderia morrer em paz!!!!

    Abraço amigão, não sabia que gostava de rock... Bacana!!!

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  3. Ah, os lugares que nos remetem às memórias vividas e por viver! Eles sempre deixam saldo positivo. Pagar algum ônus pra conferir as próprias raízes musicais é, talvez [além do show], a parte mais interessante da cota de prazer de um festival desta magnitude.
    E se no crédito final restar este belo recorte, já terá valido a pena, não é verdade?
    Sorrow e Slow Hands, belas escolhas!
    Um abração pra ti, Jorge.

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  4. Jorge, que legal!!!
    Crônica muito bem-escrita!
    Zambujeira do Mar dever ser maravilhosa!

    Ressalto a tua frase: "...indício de que tocavam com prazer para quem os soubesse escutar."
    Nossa!
    Já assisti a muitos shows musicais. Um som honesto, onde se percebe a música verdadeira, em tom quase inédito (mesmo que não o seja). Em acordes "afinados" com o ritmo proposto pela história da banda, essa é a essência.
    Embora, não se deva desconsiderar que show musical é a oportunidade do "ver" uma música, porém o principal ainda me parece, percebê-la.

    Beijos

    PS.: A gente saí de um show desses com a alma alguns anos mais nova!

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  5. Gostei de ler este artigo.
    Mostras que és conhecedor de Interpol como eu, e gostei da forma como os caracterizas-te.
    Hoje em dia já não se lêem reviews de concertos com referência à música em si, como esta.
    Já vi Interpol duas vezes e foram 2 concertos espetaculares. O do Campo Pequeno foi o melhor que vi até hoje.
    Vi o concerto do Sudoeste em direto pelo streaming do festival, foi curto e com um público não muito favorável (excepto alguns fãs) mas acho que estiveram muito bem. E estou contigo.. um dia ainda vou quero ver Interpol em Paredes de Coura, este sim seria o festival ideal para eles tocarem.. talvez lá para 2013. :)
    Cumps.

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  6. Puxa Jorge! Como é rica a velha Europa hein... Parabens pelas férias e pela viajem.
    Se tem um lugar que eu tenho vontade de conhecer é Portugal! Pra vc ficar contente e sabendo das noticias aqui da velha colônia, o time da "Portugesa de desportos", o maior time genuinamente simbolo da colônia portuguesa está em primeiro na série B do campeonato brasileiro e dessa vez ela vai subir sem problemas!
    Aqui a estão chamando de "Barcelusa".

    Hahahahahaha, parabens amigão, sua postagem me fez dar uma viajadinha!

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  7. jorgíssimo,
    ontem fiquei um tempao com amigos à beira da piscina, enxugando heinekens, sapecando carne num braseiro e falando de portugal.

    eu disse a eles: tenho um amigo no minho. preciso ir até lá reconhecê-lo... e ninguem entendeu nadica de nada.

    e aquele seu papo da reuniao do trovante me descompassou.... putz... o poeta joão monge é meu "amigo" no facebunda... o fernando júdice, também...


    to perdendo o foco.
    preciso achar que queira comprar um rim estragado.

    abração do

    roberto.

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  8. Que delícia!! Fiquei aqui a imaginar o quão delicioso deve ser participar desse festival....

    Beijos querido

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  9. Amigo,
    belíssima viagem pela música!
    fez-me reviver memórias, olhar o que ficou para trás e o tanto que ficou por fazer...
    que haja sempre música, essa pelo menos sempre fiel ao bater do coração!

    Beijinho grande, Jorge!

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  10. nossa Jorge!
    me senti lá...
    e teus comentários e observações super ligados.
    beijos..
    e,se fores pai..parabéns!

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  11. É realmente um prazer ler o que escreve. Falou sobre todas as ocorrências, sem perder, também o lado crítico, próprio de quem gosta de música, mas separa o joio do trigo.

    Bjs.

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  12. Oi, Jorge
    Pelo seu comentário,deve ter sido lindo o festival. E, a espectativa de esperar The National com todo o pessoal vibrando.

    bjs

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  13. e o meu sorriso ternamente invejoso, depois de te ler, por: "...justamente tudo o que em cada um de nós permanece para lá da frágil materialidade, [vivido e por viver]".
    adorei esta tua reportagem, encanto de amigo.
    eu acho fantástica a postura em palco de Interpol, e todo o visual com alguma formalidade.
    tudo quanto é diferente, tem preço caro...

    "... pérolas ou bolotas... !!??" hummm (rss) gostei!
    beijo meu, querido amigo.

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  14. O movimento sempre exige um bom motivo para nos colocarmos a disposição dele...

    Iria junto se estivesse por aí, Jorge!

    Um beijo.

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