quinta-feira, 19 de julho de 2012

sabe-que-não-sabe: diálogo em repouso menor, monólogo em fingimento maior


And he who forgets is destined to remember
Pearl Jam, Nothing Man


Fotografia de Jorge Pimenta



há sempre uma brisa
a repousar nos tímpanos
do grande mistério lírico.

os poemas também morrem de amores
como os homens
os deuses
a gramática
e todas as generalizações
com que enganamos a vida,
sobretudo a morte.

o poeta nada sabe de uma
crê tudo saber da outra,
mas de amor só ouviu falar
e neste sabe-que-não-sabe
ensina a loucura
enquanto os peixes acasalam
em aquários de água doce
porque há palavras que ardem na boca
antes de chegarem ao mar.

e pergunta-se
por que não consegue nadar?
e quer saber
por que as palavras são salgadas
e queimam os livros
que lhe crescem nas pontas dos dedos?

as pernas agitam-se sobre as linhas
mas as rimas roubam-lhe o chão
e o verso:

serei a mentira mais grosseira de deus?

o criador, cansado de amar com palavras,
atravessa a existência lenta
uma e outra vez
na síntese dolorosa de todas as coisas:

apenas homem a ferir palavras
e de peixe apenas sabes a morte pela boca.
apenas homem.

o dia fechou-se atrás de si,
escolheu sair do tempo.
já de costas
nem percebe aquele pequeno poema
a pestanejar nuvens
cada vez mais longe dos lábios.

Pearl Jam, Nothingman

51 comentários:

  1. Belíssimo, Poeta!

    Há tantos significados no amor "apenas homem a ferir palavras
    e de peixe apenas sabes a morte pela boca.
    apenas homem."

    Os poetas sabem pouco ou nada sobre amor e morte. E o significado do peixe, quase nada, ou nada. Mas sabem colorir, jogar borboletas e flores e fingir o amor mais que ninguém. Pela primeira vez, leio aqui, Jorge Pimenta, o verdadeiro sentido das palavras morte, amor e palavras reais.

    Beijo, Jotge!

    Mirze

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  2. as palavras tem o sal do sagrado e são insubordinadas orações do nosso dia-a-dia, nada se sabe e tudo cabe neste desconhecimento do orbe,


    abraço

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  3. o poeta debruça-se sobre própria pele e arranca versos inquietos como se fossem cascões de uma ferida em eterna cicatrização!

    e Pearl Jam é brisa...adoro!

    beijinho com encanto, poeta amigo mágico!

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  4. O poema é de uma beleza enorme. Talvez no meio de tudo, dos poemas e dos petas, das nuvens e dos caminhos, das verdades e das mentiras, dos sonhos e das realidades que existem, só o tempo restará.

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  5. Nos teus poemas escritos em parceria, encontro sempre a "tua" marca; sei das tuas palavras, teus delírios; e quando tu chegas assim inteiro, só tu, é um arrebatamento total. O poeta ensina a loucura. Desde quando te li a primeira vez soube que eu voltaria sempre para aprendê-la. Tuas imagens são pra mim libertadoras. E olha só que maravilha isso: "nem percebe aquele pequeno poema
    a pestanejar nuvens
    cada vez mais longe dos lábios." Te reler já é de lei. A cada leitura de um mesmo poema, minhas paisagens internas se estendem tanto.
    Beijos, querido.

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  6. Jorge!

    Mas que preciosidade. Gosto destes poemas que pintam suas cenas no espelho dos olhos da gente. E ficam alí depois, aliviados, entendidos...


    os poemas também morrem de amores...

    Belo!

    Beijo da Ziris

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  7. eu podia comentar de tantas outras formas, pois tu és capaz de adivinhar as palavras que me tocaram...
    apenas te digo

    não, tu és a verdade e ao sê-lo, tão nítida quase que pareces uma mentira

    beijo

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  8. Lindíssimo!
    "serei a mentira mais grosseira de deus?"

    Beijos

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  9. OLá amigo Jorge!
    Como você escreveu,poemas morrem de amor,como tudo na vida se vai com o tempo,mesmo que o céu esteja límpido e sombrio e o criador "Deus" interfere no dia e na hora,e com certeza esvai-se o tempo longo ou curto para ver a magia do viver.

    Feliz Final de semana.Beijos

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  10. Maravilhoso poema Jorge! No mar de versos o peixe engole água salgada. Lembrei-me de um trexo do livro de Clarice, quando ela bebe água salgada do mar como forma de libertação.

    grande beijo

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  11. Nos olhos, nuvens. Nos lábios, trovões.
    Beijoss

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  12. Os poemas morrem de amores...quem os lê também!
    Tudo tão bonito. Eu amo Pearl Jam! Poema, imagem e poeta, todos lindos :)

    Bjo, Jorginho

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  13. Sim, os poemas sentem. E os seus poemas, que são tão vivos, fazem um turbilhão aqui dentro. Te ler é lembrar que ainda há vida.

    E que foto show!

    Beijo.

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  14. "os poemas também morrem de amores"...

    E não é que eu nunca tinha pensado nisso...

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  15. Oi Jorge,

    Bom dia! Tudo bem?

    O texto expõe o tempo do tempo como uma primeira morte dos poemas que morrem por amor.

    O texto me fez lembrar uma frase que não lembro o autor, mas que me avó falava:"As flores dessas árvores depois nascerão mais perfumadas".

    Assim, percebo a imagem para um novo despertar para ultrapassar a mera existência.

    Bom final de semana e obrigada pela leitura que me acomodou.

    Lu

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  16. Esta música... :)
    Jorge... Eis o meu novo covil:
    http://oslugaresdemim.blogspot.pt/

    Beijo amigo,
    Margarida
    (irreversível)

    *já te sigo novamente

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  17. Fantástico... Fiquei sem palavras!

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  18. Olá, Jorge.
    Belíssimo poema, meu caro.
    Acho que o amor transcende o próprio tempo, recriando a si mesmo a cada segundo.
    Abraço, Jorge.

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  19. Poeta Jorge Pimenta:

    O poema diz tudo, a música também, a fotografia, essa, apresenta uma nesga de céu, como um aquário e o rasto de um jato - os rastos dos jatos parecem imobilizar-se no céu, como o tempo parado que vive o poeta. Que figura insondável é a estátua?

    O poeta trata Deus por deus e criador: será ele mesmo envergonhado? Deus, mesmo cansado, faz-se cada vez mais homem e convida o homem a deixar de se fazer de deus... "O Homem não tem onde pousar a cabeça!": morre pela boca; mas, é verdade, falar também (nos) mata! Para sobreviver, o poeta finge monologar... já que o diálogo está em repouso menor... aparente! Leveda em segredo, por detrás dos gestos dos dias...
    O poema dos olhos não se diz; os poemas sofrem (morrem de amores)!

    Abraço! Boa Ressureição!

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  20. Meu querido Jorge, eis que palavras certas e incertas, em águas doces ou salgadas, porque, afinal podem morrer pela boca e sem que os versos e poesias definam o que seja o amor, mesmo sabendo do gosto (doce ou salgado) e possuindo a destreza, a proeza de um peixe que nada em águas profundas ou rasas, límpidas ou turvas.

    Eu apenas sei que a palavra será definida pelo tempo e suas circunstâncias...

    Beijos e bom final de semana.

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  21. Bom amigo Jorge,
    Conseguir-se saber o que não se sabe, já é saber muito.
    Os peixes nos ensina muito sobre a vida, mas sobre morte, dão mau exemplo.
    Amar com palavras é conotação,mas com gesto, é realidade.
    As palavras são anfóteras: podem ser doces ou amargas.
    A morte do poema é figurada; a do poeta não apaga seu brilho.
    O dia se esconde para renascer com novel alumbramento.
    O poema contempla muitas questões humanas irresoluta com louvor costumeiro.
    Aqui, além de deslumbre, há sempre muita aprendizagem.

    Abraços e ótimo fim de semana para ti e família.

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  22. Eu diria que sente... e que também mente. Que se queima com as labaredas e as apaga com palavras.
    Que se acomoda em versos porque sabe que carregam sua dor, mas não a perpetuam, porque também eles têm passado. A foto está magnífica!
    Grande beijo!

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  23. Coisa mais linda, Jorginho é essa brisa a repousar nos tímpanos...
    Vamos desvendando-na aos poucos...

    Pearl Jam, morro de amores!

    Beijinho!

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  24. Jorge lindo demais seu poema e com palavras que deixam a gente vagando na superfície das suas letras.
    Beijokas doces e meu link mudou. dessiga-me e siga-me por favor.

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  25. "o Criador, cansado de amar com palavras...", no que cansou de amar com palavras, se fez carne, habitou entre nós e quis ter um relacionamento mais íntimo conosco, e selou essa amizade com sangue, vertido na cruz do calvário, maior prova de amor não houve nem haverá jamais.

    Lindo texto o teu, senti de escrever esse comentário ai em cima, abração pra ti Jorge.

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  26. Detive-me na última frase da Laura Alberto e é esta, exatamente, a sensação que tenho ao ler-te.
    Quem na verdade é criador e criatura?
    bj, poeta inspirador

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  27. O amor, pois, o poeta talvez seja o que menos sabe sobre isso. Vive cada numa constante ansiedade e procura, uma loucura aparente, que umas vezes traz respostas, outras vezes não.
    Gostei muito deste poema.
    Beijinhos

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  28. Oi Jorge

    Como diz Florbela Espanca:

    "Ser poeta é ser mendigo e dar como quem seja Rei do Reino de Aquém e de Além Dor!"

    Como diz Jorge Pimenta:

    "O poeta nada sabe de uma
    crê tudo saber da outra"

    Puxa, jorge!
    Que fotografia!
    Que instante eternizado!
    Que olhar!

    Beijos

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  29. Achei interessante alguns elementos em sua poesia. O peixe, o homem, a vida e a morte. Sao elementos tão próximos e com tanta representação que só pode o poeta observa-los e quem sabe impor uma dança lenta de palavras para se saber o que desde sempre se sabe: nada.


    Bacio e uma excelente semana para temos olhos...

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  30. "Serei a mentira mais grosseira de Deus?"

    Jorgíssimo
    A mentira não dá vislumbres. E como explicar os arroubos de todos que te lêem?
    A sua poesia pulsa e se expande. Então é a verdade inspirada pelo Criador.

    Um bom início de semana
    Beijos

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  31. Jorge, querido PoetAmigo!
    Hoje não terei tempo para comentar a partir da fotografia, mas só ela, te garanto, são muitas linhas de um poema..., e tão maravilhoso resultado!

    Recordei-me da última estrofe do ‘soneto de outrora’ de Marcos Kawanami.
    “Ao que eu, transido de solene horror,
    Respondo com a frase das outroras:
    Ao bardo cabe amar, mas não o amor.”

    Penso na Poesia como a gênese:
    ‘E Deus criou no primeiro dia a Poesia e...’;
    - como o prefácio de um livro a ser escrito.
    Ao poeta cabe o ofício de cruzar o espaço na sua atemporalidade sem medidas ao firmamento. Se é verdade ou fingimento; se há mesmo alegria ou dor; amor, e ainda que se ame, intenso ou morno; se um dia será concreto ou não... Parece-me menor quando se percebe na Poesia um ponto de partida:
    as palavras que constroem pontes sobre o oceano, que dão asas aos homens ou línguas de fogo às árvores representam a gênese: o ponto do sabe-que-não-sabe, depois de tudo que não se lembra.

    Não deixemos que a Poesia morra de realidade, porque poderá não haver antídoto eficaz para o desamor.

    Beijos!

    PS.: Na sexta-feira passada foi o último dia da Oficina Poética que dei às crianças. Deixo-te aqui algumas definições que esses pequenos lançaram a respeito de Poesia (crianças de 5 e 6 anos):
    "Poesia é o que se escreve."
    "Poesia é música."
    "Poesia é teatro."

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  32. Ah! Antes que eu me esqueça, mais uma publicação do ensaio que fiz a partir de teu poema. Agora, foi no jornal Diário Popular de sábado, o dia mais lido, da cidade de Pelotas, terra natal do nosso amigo em comum Jacques.

    Mais beijos, Jorge!
    Agradeço por tua Poesia movimentar meu mundo e o de tantos amigos!

    http://www.diariopopular.com.br/site/content/noticias/detalhe.php?id=8&noticia=54983

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  33. Imagens esculpidas com uma beleza e força singulares.

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  34. Meu querido amigo,
    que palavras mais lindas!!
    Como sempre fico encantada com todas as suas palavras derramadas aqui, é sempre tão belo e verdadeiro, verbos que rasgam a alma.

    O poeta nada sabe,
    crê apenas em suas letras,
    ou, as vezes, nem acredita nos versos derramados.
    O poeta sabe apenas fingir desejos em letras apagadas...

    Beijos meu amigo lindo

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  35. Jorge Pimenta, há tempos meus ventos não te ouviam. poema salgado,e claro, poesia dessa terra que nâo esquece de zarpar. muito refinado.

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  36. jorgíssimo,
    saudades de ti... saudades de nós...
    saudades de vir por aqui e saborear uma aklheira de caça, escutar os pitons acima das cabeças na pedreira, abraçar você e os seus.

    abraçar sua poesia.


    to procurando tino.
    do verbo atinar.

    esse menino em busca de um norte, o


    r.

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  37. o que arde nos livros marca também nossas peles delicadas de papel.
    beijo

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  39. Ciderei na fotografia.
    Grata por toda a beleza.

    Blue

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  40. Noto uma tremenda inquietação, sinal de também uma tremenda sensibilidade. Parabéns intensos.

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  41. Meu querido Jorge

    Palavras?...não tenho, apenas uma imensa admiração.

    Ninguém tente entender a poesia...a alma do poeta é procura
    É o coração em chamas...o frio da alma...a negridão da noite
    É loucura que desliza ao sabor da pena em eterna amargura
    É a droga do corpo...o sangue a latejar... a solidão da morte

    Deixo-te este rascunho e um beijinho com carinho.
    Sonhadora

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  42. De quando na dança estonteante das palavras ferve, ardente e lúcida, a poesia.

    Lindo, Jorge!

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  43. e pestanejar nuvens é algo tão elevado quanto escrever maravilhas- como escreves

    beijo

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  44. Querido Jorge, como sempre suas linhas transcritas, me encanta.
    Beijos, bom final de semana.

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  45. "...a pestanejar nuvens
    cada vez mais longe dos lábios."

    amigo, perco-me de belas imagens com as tuas palavras!
    um beijinho enorme enorme! :-)

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  46. Olá, Jorge
    e não há como não comentar a fotografia, que demais!

    há sempre uma brisa


    acredito que podemos até tentar enganar a vida mas será que conseguimos enganar a morte? acredito que não.

    o poeta ama, é louco

    beijo grande pra ti

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  47. o que é falar de amar? sentir a vida..
    antecipar a morte..
    nada sabemos neste tempo rápido e eterno ao mesmo tempo..
    me aconchego em teus pensamentos querido Jorge..
    beijos.

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  48. É, certamente, uma das fotos mais bonitas que eu vi nos últimos tempos, Jorge!
    E sobre beleza: a ideia do poema como um ser que sente, ao avesso da gente sentindo o poema, é de uma transgressão maravilhosa ...e a brisa deixa isso evidente. Difícil é não sensibilizar uma palavra tua e não se sensibilizar com um poema teu, em toda visão, mesmo que fugidia, há mundos inteiros que mudam infindavelmente. É belo e intenso.
    Recebe um abração, já estava com saudades de estar por aqui.

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  49. Olá, Jorge.
    Muito bom o seu blog...belas fotografias!
    Um abraço.
    Margleice

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